16.3.11

Cinco minutos

In https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiw71tDsu-4wXcc2hWE9BRLg5FFlsCHHpWcKsR48sYd2Sz6KPR3St1Vinx2o_ABO7lUosyCsKQjn3X96fc5tdWOryjpErP1V8Dev2ZQLnLZOacykZUpq3XNMkN2a_10bR7xbqu13g/s320/cinco+minutos.jpg
Às vezes chegavam cinco minutos. Para dizer o que ficou guardado. Para sempre guardado como se o silêncio agilizasse o arrependimento. Cinco minutos para trazer à tona as sinfonias que ora descompõem os sentidos, ora os enfeitam com as pétalas acrisoladas da inocente espontaneidade. Um pequeno desencontro, ou a asfixia dos sentidos que devolve a perenidade dos silêncios, sepultam a oportunidade. O tempo passou como se alguém chegasse ao apeadeiro e só conseguisse avistar o comboio a diluir-se no horizonte.
Nos cinco reclamados minutos – a eternidade que separa a probidade das palavras embutidas no silêncio – encerram-se as tonalidades do desperdício. Quando, no mosaico da introspecção, soam as sirenes do arrependimento, contam-se as lágrimas vertidas por não terem sido entoadas as palavras no tempo que lhes era devido. Contam-se outras tantas lágrimas que avivam a carne que sangra por dentro. Oxalá aqueles cinco minutos abrigassem a inércia do tempo, como se alguém soubesse resgatar o tempo emoldurado da sua empoeirada moldura. Depois, em contravenção com a honradez do presente, desfilavam especulações inúteis. A contrafactual especulação, os cinco minutos como cicatriz por sarar, ou a ceifa que obriga a demora do passado.
Se ao menos os cinco minutos não tivessem sido gastos em silêncios covardes. Se ao menos os cinco minutos não fossem uma capitulação das ansiedades que incineravam as veias, deixando-as num fogo brando que retomava as cinzas onde se depunha o corpo. Se aqueles cinco minutos não fossem uma espada cortante trespassando as costas da lucidez. Tudo, enfim, seria diferente. Como se uma terrível conjugação de efeitos cósmicos mudasse o futuro e, do mesmo passo, compusesse outra partitura por onde desfilasse o tempo ido.
Mas os cinco minutos não são um retrato da intemporalidade. A suspensão dos relógios é uma impossibilidade quando vamos mais adiante e, na latejante retrospectiva, os arrependimentos se almofadam na teimosa lembrança. Os arrependimentos são a demissão do livre arbítrio que se sobrepõe à covarde elegia do resgate que viria se os cinco minutos, os cinco vitais minutos, pudessem ser repostos no lugar de onde se dissolveram.
Esses cinco minutos apressavam as precipitações. Se há pesar não é por terem sido arpoados silêncios em todos os cinco minutos repetidos por tempo sem conta. Os cinco minutos, pudessem eles ser resgatados à absoluta rigidez dos arcaísmos, não seriam tanta demora. O aluvião de cinco minutos entretanto depostos em clepsidras translúcidas apruma os sentidos. Pudessem os relógios todos recuar até aos reivindicados cinco minutos onde fermentam (na aparência) os pesares. Às vezes, os arrependimentos não trazem os equívocos a tiracolo. São o manto perfeito para a confirmação de um outrora qualquer. Cinco minutos que deixam de ser extemporâneos. Cinco minutos, uma eternidade que podia ser consumida no instante de um fósforo em decadência. Os olhos embotados cerceavam a clareza. Adiavam os cinco minutos. Tornavam-se lancinantes os cinco minutos prolongados, uma e outra vez. Uma coreografia desconchavada entre covardia e coragem, com o pêndulo a cair para a primeira.
Se ao menos os cinco minutos, esses cinco minutos repensados que aterram com a aura sombria dos dias que foram, fossem condensados nuns claros segundos. Para os campos mentais deixarem de fertilizar arrependimentos. Os inúteis arrependimentos.

5 comentários:

Vanessa, a Mãe Possessa disse...

Fez-me recordar os verdes anos de adolescente, onde o futuro era completamente irreflectido, tropeçando constantemente no baraço de nada ficar por dizer.
Depois vamo-nos carregando de silêncios.
Claro que haverá um limite a freios. Talvez por isso os mais velhos sejam tão desbocados (risos)!

* disse...

Muito muito bom!!!... mais uma vez tive a ousadia de lhe "roubar" um post...
:)

PVM disse...

Amadurecemos. E porque nos ensinam que a madurez implica polimentos deixamos as palavras (as palavras que deviam ser ditas) para trás.

PVM disse...

Blue Angel: sirva-se à vontade.

Vanessa, a Mãe Possessa disse...

O arrependimento arrasta sempre pela cauda resquícios de esperança. Assim o pêndulo hesitante não sossega. Há que pagar para ver ou então para esquecer a fatídica mão cheia de minutos.
Sim, eu sei, para quem assiste, é fácil dirigir os trabalhos!