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Não, não é valentia. Ou sequer demência,
dizendo os outros que a empreitada está fadada ao malogro. Não é essência da
têmpera, que o tempero da alma não carece de adjetivos pomposos nem de mapas
descoloridos. Torpes, uns quantos, salivam matéria pútrida. Não interessa. Mas
afinal interessa: é assobiar para o alto e dedicar às urdiduras a gélida
indiferença.
É a alma que não se rende. Nem sequer
aos silogismos da estratégia, dos que calculam os reptos, estimam o pulso dos
ventos que sopram e decidem parar agora, se preciso for recuar duas posições e
só avançar depois. Esses calculismos não pertencem à matéria genética da alma
sem capitulações. Arranjam apoquentações. Era melhor não as arranjar. O corpo
não tergiversa quando os sobressaltos que não domina arremetem com a sua fúria.
Depois dói-se, o corpo. Mas a alma não se rende. Não se resigna, nem faz de
conta que não é ultrajada, mas não afocinha na lama de quem ultraja. Não se
rende, porque assume a indiferença.
As vozes que perderam açaime berram,
tresloucadas, como guitarras distorcidas dedilhadas com furiosa acidez. Os
olhares que reprovam, como se lhes fosse dado serem juízos do comportamento
outro, dirigem censura eloquente. Acreditam que o olhar incisivo esmaga os
diletos filhos da transgressão. É como se esquadrinhassem a parede de uma
barragem em demanda de pequenas fissuras, só para esgravatarem por entre as
fissuras e derrubarem a presa. Mas as entranhas do paredão estão sólidas, não há
fissuras sequer milimétricas. Pois a alma que se não rende aprendeu a tecer sólido
ancoradouro à prova de bala – de qualquer bala. A alma que não se rende
tornou-se invulnerável, uma muralha férrea que não se enferruja. Aprendeu a ser
humilde, na recusa das tresloucadas andanças que não sopesam os contratempos
que o porvir monta nas costas distraídas dos desapossados da lucidez.
É a frugalidade do tempo que se
cristaliza docemente. Calejada, a alma perdeu as ilusões destravadas que
alimentam um módico de loucura juvenil. Calejada, temperou-se em sua frugal
indiferença. Agora padece de um saudável ensimesmar. Ganhou tempo com o tempo
que foi ido. Tornou-se mantimento de si mesma. E agora não se rende nem resvala
para a extravagância tumular da teimosia. Dir-se-ia que nunca viu tão nítido.
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