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Podemos falar de flores sem usar o
belo (ou palavras que dele derivam)?
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Podemos. Apalavramos as meadas e
deixamos travão nas que não queremos.
- Sabes? Eu acho que todas as pessoas
têm o seu campo de flores. Flores diferentes, em número diferente, com odores
que traduzem a têmpera diferente. Flores como expressão da diferença que nos
enriquece. As pessoas regressam sempre ao seu campo de flores. Gostam de as
apreciar, campestres e singelas, ou as que ornamentam bouquets requintados.
- E porque dizes isso?
- É o nosso elemento terrestre. Ninguém
se atreve a demorar em áridos lugares. Tanta aridez cativa a necessidade das
flores.
- Mas pode ser apenas uma coincidência.
Ou podem as pessoas que resgatam seus campos de flores fazê-lo por espontânea
ordenança.
- Admite: há quem procure exílio num
prado vicejante. Quem os procure até em dias tristonhos, com a resplandecência
do sol locupletada pelas pesadas nuvens de chumbo. É como se estivessem a
regressar às origens.
- Nem tudo procede das flores...
- ...Enganas-te. Até os pescadores se
inebriam quando um punhado de flores convoca a atenção de uns olhos adestrados
pela monotonia do mar sempre igual. Até os mais boçais não ficam a elas
indiferentes.
- E o que fazem as pessoas em seus
campos de flores?
- Bebem o perfume, extasiam-se com a
quimera de cores que irradia das flores espalhadas pelo campo. Tiram
fotografias visuais e resguardam as festivas flores num canto da memória. Mesmo
a jeito de serem caução que resgata o corpo de um sobressalto imprevisto.
- Continuamos sem falar de beleza.
- Não é preciso. É inata quando orquestramos
as palavras que adelgaçam a feitura das flores diante dos olhos.
- Gostavas de ter flores quotidianas?
- Não!
- Não te entendo.
- As flores não podem ser para todos os
dias. Perderiam serventia. Seria banalizá-las. Elas não merecem a desfeita. Nem
nós, pois apoucá-las na rotina será retirar o ouro que assenta em nosso regaço.
- Só servem as flores ocasionais.
- Ocasionais. Ou o retiro das arrelias
da cidade. Um exílio que se impõe quando as arrelias desarmonizam. Por essa
altura, convém inundar a casa com flores. Deitá-las numa aleatória
configuração, espalhadas pela casa fora, sem critério. Até que, à noite, o
leito em que repousamos seja uma cama de flores.
- Como se a cama de flores fosse sucedâneo
do matricial campo de flores.
- Isso.
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