dEUS, "Eternal Woman", in http://www.youtube.com/watch?v=Horl9gLzs_c
(Dia internacional da mulher, dois dias
de atraso)
Um ateu não acredita em deus. Podia
repensar a dúvida metódica (convertida em certeza contrafactual: pois deus não
se vê) se jurassem, com científica certeza categórica, que as divindades são as
mulheres. Todas. As mulheres boas e as mulheres más. Novas e idosas. Sem olhar
a credos e raças. Ou à estética nem à ética, ou às respetivas ausências.
Deusas são as mulheres, contra os
escritores misóginos que trataram de as depreciar em páginas corridas que são
confissão de impotência pessoal destes agiotas da masculinidade. São mães,
amigas, companheiras, ou apenas mulheres que passam na rua na indiferença do
bulício citadino. Geram-nos. Amamentam-nos. Acarinham-nos como mais ninguém o
consegue, mercê dos laços filiais, comunhão de carne e sangue. São amigas. E companheiras,
outra carnalidade, diferente. Nelas fervilha uma sensibilidade à parte. Uma
intuição que desponta a inveja masculina. É falaz dizer-se que são o sexo
fraco: a elas assiste uma força motriz que não tem par. São um oráculo onde se
depositam os afetos. O seu riso aberto é uma janela que se abre, ampla, ao ar
fresco guardado no exterior. A pele suave, desconhecida no sexo masculino, é
convite ao desvelo. Os cuidados nos arranjos (que tropeçam na artificialidade
se forem excessivos) não são caso de frivolidade; são expressão de uma
sensibilidade inata que os homens admiram e, nem que seja por silêncios
cúmplices, encorajam.
A mulher é um esteio onde se escora um
homem. A casa sagrada onde se dividem segredos. Um ouvido lúcido e adestrado
para os conselhos avisados em maré de tempestade. Portadora de uma fibra
singular que adultera as convenções (afinal elas são o sexo forte). Os homens
mantêm uma relação ambígua com as mulheres, sequestrados num mar de
contradições. Invejam-nas e desdenham delas. Querem-nas em toda a sua volúpia e
confessam que as coisificam amiúde, para logo a seguir sobre elas deitarem o opróbrio
da complexidade inútil. Sem darem conta, prestam-lhes a maior homenagem: pois
elas são armadoras de desejos, deixando que o reputado “sexo forte” se enrede
em fragilidades irremediáveis. Só quem se vê imerso em sua imensa fraqueza é
que ostenta, com boçalidade marialva, que é o sexo forte.
Essas proclamações, e aqueles varões que
se embebem no convencimento da masculina superioridade, são a silenciosa
demonstração de todo o seu contrário: fortes são as mulheres; e deusas, por
tanto aturarem o pedantismo varonil, são também as mulheres.
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