Nilüfer Yanya, “In Your Head”, in https://www.youtube.com/watch?v=fsxf541UI-8
O umbilical ouvido não decai na desatenção. Todos os ruídos são colheita. Não te enganes: todos os ruídos são colheita. Como numa prosa, todas as palavras merecem igual atenção. Ou corres o risco de perder parte do sentido. E ao perderes parte do sentido, ficas com a história amputada; nem que seja um fragmento, uma pequena parcela perdida no ardil da desatenção. Ao olhar soerguem-se as braçadas ritmadas dos transeuntes. Parece que nadam em seu gesticular, os gestos como coreografia que empresta outro sentido, um sentido mais expressivo, às palavras que são ditas. Como se as palavras fossem digladiadas. Não adiantam os rostos seráficos que desafiam, em sua impassibilidade, os gestos excessivos. Dir-se-ia que embaciam a palavra dita, gestos assim coreografados. Alguém propõe: invente-se um modo de meter os gestos entre parêntesis. Os parênteses seriam a representação gráfica dos gestos que destronam o império das palavras. Para não serem ruído transfigurando as palavras em babugem. Mas as mãos, personificação dos vasos capilares que ecoam o tatear, não podem ser silenciadas neste teatro dos sentidos. Se os olhos estiverem fechados, as mãos são os nossos olhos – não te esqueças. Talvez seja possível às mãos decifrarem as palavras embainhadas nos ruídos que pontificam nas imediações. Não sejam contumazes as marés que orientam as palavras decantadas dos gestos – pois aos gestos deixa-se o seu lugar próprio, que será o dos mestres da coreografia. Em véspera de celebrações, ao palco só merece subir o altar onde se celebra o motivo da celebração. O resto é momentaneamente atirado para dentro de um largo parêntesis, à espera que uma constelação de parênteses se ofereça sucessivamente em seu palimpsesto. E perguntas: o que é feito da palavra que se emancipou do parêntesis? Terá a palavra sido metamorfoseada num parêntesis de si mesma, nele emaranhada? Tens de esperar pelo dia que se segue. E apurar, no rescaldo de todo o suor derramado, entre o restolho, o que ficou das palavras não silenciadas pelos parênteses.
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