16.9.24

Cidade fantasma (excurso pela masculinidade tóxica)

Nick Cave and the Bad Seeds, “Conversion”, in https://www.youtube.com/watch?v=NHbQFArmxdc

Também posso ter teorias interiores: os marialvas que sobem muitos degraus acima das mulheres e passeiam prosápia, fazem-no como válvula de escape de inconfessáveis fragilidades intrínsecas. 

Elaboro: desprezam as mulheres e consideram-nas o sexo fraco porque se recusam a admitir que fraco é o sexo deles. Em abono da minha teoria gratuita, atiro para o ar uns elementos fartamente especulativos: estes homenzarrões de falaz linhagem não admitem que não são amantes dignos do termo, porque terão notado (se é que não houve mulheres que lhes disseram num assomo de franqueza) que não conseguiram atingir se não o seu próprio clímax, incapazes de cuidarem da reciprocidade que não lhes importa. Não se lamentem de serem rejeitados no mercado dos prazeres carnais por apenas cuidarem do seu, num egoísmo que quadra com os cânones da masculinidade tóxica.

Atormentados pelas dúvidas existenciais que levantam tempestades interiores e abrem fendas no seu muito prezado orgulho másculo, vingam-se nas mulheres, que são atiradas para um lugar secundário na ordem social. Manifestam um tal jaez intelectual que os eleva ao olimpo reservado aos apedeutas. Por fora das angústias interiores que ora os consomem sem darem parte de fraco, ora asfixiam como parte do fingimento de que fazem parte, os marialvas acusam as mulheres de não conseguirem integrar a comandita do prazer e diagnosticam o mal: está nelas, longe de admitirem que personagens tão varonis possam ser apontadas pelas omissas proezas do foro.

Ato contínuo, tecem os caminhos simplistas nos vagos e também simplistas corredores do raciocínio em que se debatem: não podem ser acusados das frustrações carnais das suas parceiras, habituais ou ocasionais, pois eles tiveram prova cabal do seu desempenho que teve o epílogo esperado. Comportam-se como se um par dançasse apenas com as pernas de um deles, o outro desobrigado de contribuir para a sintonia do duo. O sexo, para estes beócios, é uma interação em que os dois corpos se desligam quando o deles se saciou. Pobres de qualidades mentais, endossam a culpa da coreografia embuçada para as mulheres. Sem saberem que deles é tanta a responsabilidade pelo auge que elas não alcancem.

A masculinidade tóxica é um sintoma da tremenda fragilidade dos varões que se passeiam ufanos das suas proezas que não passam do calibre do imaginário. Rejeitados por elas, ou pelo menos sabedores que elas não os avaliam como eles têm a certeza que devem ser avaliados, vingam-se dedicando o desprezo a quem está destinado a ser um ser inferior. 

Não dão conta que tanta prosápia, tanta arrogância, são o sinal distintivo de que eles é que são o autêntico sexo fraco.

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