Osso Vaidoso, “Elogio da Pobreza”, in https://www.youtube.com/watch?v=eA32AyqG9mQ
Atordoado, patrocino a pele de galinha. Há aquele olhar que está virado para a transgressão – dirias, em jeito de memória futura, que está explicado porque viraste as costas às leis e ordenanças, um certo savoir-être com laivos de anarquia.
Atordoado e, mesmo assim, penhor de uma bússola que certifica apenas os paradeiros em perda. Não se esperem localizações determinadas com precisão matemática. Não têm validade esses espiões disfarçados que querem saber de todos os paradeiros possíveis. Este é um deslugar que se desliga de pertenças, ou um lugar onde se açambarca a gramática da despertença. Um feixe de desacontecimentos – antes que se esgotem todos os “des” e o resto fique com a espessura de uma maionese deslaçada.
Nem por isso renego o osso vaidoso, o ínfimo osso vaidoso que se esconde bem próximo do magma que hiberna como se fosse um vulcão adormecido. As juras latentes não passam de miragens que rendem o lugar da desesperança. Não são as manhãs sombrias que arrematam a amargura que rima com a deselegância do mundo. As manhãs são sempre a melhor elegia da noite que é sua véspera. Um encantamento que reabilita o horizonte entrecruzado nos dedos que desenham o dia vindouro. Às vinhas onde estagia o pensamento vou buscar as palavras que não se coíbem com a apatia. Aprendo que o dia vindouro não pode ser um presídio.
Não é imodéstia consagrar o osso vaidoso que descuida os preparos convencionados. Mantido sob a tutela apertada da discrição, ateia a combustão da pele que a reveste da indiferença necessária. Podem verter toda a pimenta sobre as feridas por cicatrizar; a tatuagem indelével, o recobro onde levitam as cicatrizes esperadas, cobre-se de coragem quando os dias se servem de contratempos. Empunho o espelho retemperado e escolho o tempo a preceito; não me deixo enfeitiçar pelas juras do futuro, o corpo ficaria amortalhado na semântica embuçada que arremata as palavras maçadoras.
Próximo do mais profundo magma, o osso continua vaidoso. Mas não digo a ninguém.
Sem comentários:
Enviar um comentário