Max Richter, “November”, in https://www.youtube.com/watch?v=FPKgk5_YmpA
O segredo é deixar alguém a falar sozinho quando se pressente que o contrário agride a lisura mental. Há pendências que devem ficar desertas, por falta de comparência. A demissão de falar não é uma capitulação.
Invoca-se um risco de assim proceder: a soez voz monopolista ocupa todo o espaço, sem contraditório que possa desmontar essa voz ruidosa. Quando alguém monopoliza com a sua voz, a audiência não tem como escolher; a escolha está feita à partida, por falta de comparência ou omissão intencional das vozes que podiam quebrar as pernas à voz monopolista.
A infantilização da audiência é exagerada. É preciso confiança na diligência das pessoas, não as atrair para um canto onde são tratadas como se não pudessem forcejar a sua própria autonomia. A falta de comparência não é um desencorajamento interior colhido do medo de falar com o outro. É um critério de sanidade: se o outro é sócio da desonestidade intelectual e enxameia o discurso com truques de retórica rasteiros, e se perpassa a leve desconfiança que a discussão será invadida por golpes baixos e pela lama onde gravita o outro, o melhor é não lhe dar o palco que ambiciona. Ou, o que é pior, e sem ele conseguir perceber que é, que lhe seja dado o palco em regime de monopólio, para que mais ninguém suba a cena enquanto estiver em palco.
A falta de comparência é em proveito de quem falta e de todos os outros. O faltoso não tem de lidar com o canhestro. Não cai no logro de quem defende que é imperativo contrariar o canhestro, correndo o risco de dele ser a única voz que chega aos destinatários. A audiência que pensa pela sua cabeça não tem de assistir a uma discussão em que participa apenas um, por falta de comparência dos outros.
Há ocasiões em que a falta de comparência é a prova de sensatez.
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