29.5.09

A muito pouco edificante finança


Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades?


Hoje é quase como se fosse um daqueles arautos da desgraça do capitalismo, sempre a reclamar contra a globalização e o consumismo e a ganância de um punhado de gente que mete facas nas costas de todos que aparecerem pela frente só para amealharem uma fortuna obscena. Por um dia, um dia que seja, palavras que destoam. Pois há gente que se inebria com o poder do dinheiro. Gente que terá vindo do nada e trepou a escada do poder, granjeando muitos e importantes contactos que depois alimentaram negócios rendosos. Mas quanto mais se amealha, mais alto sobe a fasquia. Outros negócios, que multipliquem os proventos a uma escala exponencial. Com franqueza, entendo agora os que interrogam: para que quer esta gente embolsar tanta abastança?


O contexto é o das salgalhadas do BPN, o cemitério de personalidades que fizeram parte do imaginário cavaquista (antes da segunda vida política de Cavaco). Gente que nunca cirandou no mundo da alta finança e que, de repente, desatou a fundar bancos e a fazer desses bancos invejáveis (para quem anda no ramo) exemplos de entidades lucrativas, muito lucrativas, miraculosamente lucrativas. Não há como escapar à pergunta: terão essas figuras aproveitado o poder que tiveram na política para dar o salto para o mundo da banca? E outra interrogação que não me sai da cabeça: é legítima a passagem de um hemisfério ao outro?


Por genética, adverso a proibições. Só que às vezes, quando vejo estes nada edificantes episódios de gente transviada da política para a alta finança e que depois é apanhada num fogo que mistura ganância com ilegalidades, sobe em mim um impulso. Um impulso que permitisse legislação a impedir que gente que ocupou importantes cargos políticos pudesse transitar para a alta finança ou para grandes conglomerados de empresas, assim que deixasse o cadeirão do poder. Reprimo, contudo, o impulso. A rejeição das proibições fala mais alto.


Do que esta gente não se livra é da pinta de marmanjo. Dos marmanjos típicos, os Chico-espertos que navegam à superfície à custa de arranjinhos e manobras duvidosas, distingue-se pela pose aprumada, pela respeitabilidade que chama a si pelo lastro de governante. Tirando isso, exalam uma pestilência que faz deles personagens tão pouco recomendáveis como os marmanjos de má pinta. Quando o antigo presidente do BPN se libertou do silêncio e provocou um terramoto, pouco interessa saber quem conta a verdade e quem está embrenhado em mentiras sem fim. Suspeito que há por ali muitas mentiras, contadas por todos os envolvidos, e despeito, muito despeito. Ao menos o pouco edificante episódio de lavagem de roupa suja na lavandaria do parlamento serviu para que o senhor conselheiro de Estado escolhido pelo presidente da república percebesse o fim que o reservava. Demorou, mas chegou o dia em que abandonou o Conselho de Estado. Terminou a sua carreira política (se, por uma vez, esta terrinha for um lugar normal).


Dias Loureiro foi, em tempos, entronizado delfim de Cavaco por certa imprensa. Ainda me lembro, já há uns largos anos, de o Expresso ter dado à estampa uma reportagem que especulava o que seria esta terra vinte anos mais tarde; Dias Loureiro era o primeiro-ministro… O homem com cara de carneiro mal morto, o homem que ao falar me deixa a impressão que mente por todos os poros, acabou. Pode ser que comece uma limpeza maior na alta finança, onde permanecem figurões que foram da política e se passaram para a finança.


O nada edificante episódio deixou outro rastilho de pólvora. O vital candidato socialista, desastrado como o conhecemos, veio exigir que o PSD faça uma caça às bruxas. Pois o caso BPN é a vergonha actual de um certo PSD herdeiro do cavaquismo de primeira geração (se é que há duas gerações de cavaquismo). O vital candidato só atrapalha os camaradas socialistas e incomoda o grande líder da nação: então não se lembra que foi Dias Loureiro que apresentou a biografia (ou devemos chamar hagiografia) do querido menino do PS?

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