8.4.11

O ego pernão


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Diz-me: qual é a serventia de um ego? Um ego desmedido, como o que adeja, qual aura impressionante, quando deixas atrás de ti uma sombra. Para que serve um ego desses?
Dizem que somos ilhas. Que não existe altruísmo. Serão truísmos como os outros: falazes, encenações ludibriosas, um oráculo da incapacidade que nos agita nas areias movediças onde sentimos o solo escapar-se debaixo dos pés. E se nos disserem que há por aí muita gente empenhada à desinteressada generosidade, desconfia, que as missões pertencem aos que se desapossaram de si. Esses, na lonjura de si mesmos, são os perfeitos suicidas da sua individualidade. Covardes.
Mas, em contrapartida, de que vale sermos os nossos maiores admiradores? Será que nos contemplamos ao espelho? Será que passamos pelos lugares em demanda da benevolência dos outros – como se as carências fossem compensadas pela suposta idolatria? Na lotaria dos sentimentos, julgamo-nos taludas gordas. Matéria sumarenta que aos outros é dada a apreciar. Nisso, o altruísmo de que nos embebemos.
É quando tiramos uma estatura maior que a nossa que pisamos o lodaçal egocêntrico. Julgamo-nos majestosas ilhas. À nossa volta, ilhas menores, um séquito em forma de arquipélago. Ou então somos – julgamos ser, deveria ser dito para não trair o rigor – a estrela centrípeta de um qualquer sistema celestial, todos os demais planetas movendo-se em nosso redor. E queremos vassalagem? Pois se isso alumia as centelhas que desdobram os vértices do ego. Nessa altura, o ego inflamado toma conta de tudo. Há ciladas pelo meio, a lucidez transbordando das margens ao ponto de deixar de ser lucidez. A sombra projectada é maior que a nossa estatura.
Um especialista dos comportamentos daria elaborada explicação para os desatinos do ego que sai das suas medidas. Diria, talvez, que sobram assuntos mal resolvidos do tempo pretérito. Feridas ainda assanhadas que fogem do sal que nelas se polvilha, fogem através do refúgio numa torre de marfim onde nidifica o ego maior que a estatura do ser que somos. Uma ilusão, como se a ilha fosse um tesouro na aparência; estando despojada de gente, a ilha vale uma ninharia.
 As medidas são compassos desconjuntados. É como se as lentes dos óculos desfocassem os contornos das coisas que desfilam diante dos olhos. Essas coisas são a projecção, de fora para dentro, do ego que se passeia por fora de nós. Aos outros exigimos adulação. Porque, na mais sentida das confissões que transbordam as margens da lucidez em perdição, somos um tremendo nada se desconfiamos que não há vivalma que goste de nós. Um altruísmo metido do avesso. O centrípeto ego desfaz-se nos seus escombros quando as ilhas em adjacência limam as arestas que separam os territórios da desafeição.
O que interessa, afinal, um ego? Que medidas pungentes reduzem o ser ao ego que é de uma medida maior que a estatura? Seria a vez dos especialistas dos comportamentos lavrarem sentença. Podemos alvitrá-la. Um ego tão centrípeto é uma ilha que vagueia, sozinha e distante, no meio da planura do vasto oceano. Os passos saem todos trocados. E as medidas, traídas pela ausente calibração, desfocam os olhares.
O ego é um ardil fabricado pelos jokers da ilusão que habitam em nós.

1 comentário:

Vanessa, a Mãe Possessa disse...

É esse mesmo ego que majora hesitações e receios, o mesmo que nos incita ao estouvado caminhar sobre lâminas, vulgo "correr riscos".
Por vezes ganha-se, mas não deixa de ser uma vida rasgada.
Por vezes perde-se, mas é possível recomeçar.
Um deus em nós que tudo torna possível,com caprichos naturais de se fazer luzir e de ver a semente espalhada pelos ventos.
Tudo depende da dieta que se lhe oferece!