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Não sei se este texto transpira derrotismo. Ou apenas a resignação que se depõe diante da realidade dilacerante. Este texto podia ser um hino a um idealismo. Uma partitura cheia de arabescos, as claves enfeitadas por uma quimera de europeísmo de vanguarda. Todavia, a utopia esbarra nas histórias que lacram a sua impossibilidade.
A Europa já leva quase sessenta anos. Cresceu. No número de países que quiseram abraçar a experiência e no projecto, à medida de pequenos passos, até dezassete países partilharem a mesma moeda. Os especialistas divergem acerca da natureza da Europa. Ficou famosa a metáfora do elefante e do cego para descrever o impasse em que caíram. Só sabem que é um corpo enorme e inamovível; desprovidos de visão, não são capazes de lhe tirar as medidas, não podendo saber qual é a natureza do animal.
Esta Europa que já leva quase sessenta anos ainda não cresceu ao ponto de, nos momentos críticos, trazer à superfície valores e interesses comuns que se sobreponham aos egoísmos dos países? Se a Europa for uma Europa das nações, os interesses nacionais sobrepujam um suposto interesse europeu. Mas se a Europa for mais que o somatório dos países talvez faça sentido procurar um devir europeu, genuinamente europeu, e que os interesses do todo se sobreponham aos interesses nacionais.
Os acontecimentos recentes – a reacção à crise económica que se transformou em crise da dívida pública dos pobretanas – ensinam que na hora do acerto de contas os países é que se fazem ouvir. O interesse europeu é letra morta. Sucumbe perante egoísmos nacionais. E não se diga, como é costume, que cede diante dos interesses de “certos países” – tomando por junto os que conduzem a Europa, os mais poderosos. Os apaixonados do europeísmo apressaram-se a lançar a ira sobre a Alemanha. Argumentam: não soube estar à altura da dimensão europeia que não casa com os (ausentes) pergaminhos europeístas da respectiva liderança. Mas afinal, os pequenos também podem fazer mossa. Na semana passada, fez alarido a possibilidade de a Finlândia (depois das eleições de ontem) não pagar o seu quinhão no resgate de Portugal.
Compreendo as críticas dos europeístas apaixonados. Admito que, no plano das ideias (quando as pinceladas da realidade são ofuscadas por lampejos de teoria), também sou um apaixonado pelo europeísmo. O passado repleto de sangue derramado em guerras estultas é a caução deste idealismo. Todavia, é esse passado que, admito, impede que o idealismo se funda com a realidade. À falta de líderes nacionais com visão europeia descomprometida, a imensa nau que é a Europa continuará a ter um rumo errante, ao sabor dos jogos de interesses dos países. Continuarão a mandar os que podem (e quem paga).
A complicação do momento podia ser a oportunidade para um passo em frente, para os Estados Unidos da Europa? Só no papel. No tabuleiro de xadrez apenas se têm jogado os interesses dos países que contam (e de outros que, em fugazes episódios, esticam a cabeça). Não é que um oráculo destape as tonalidades do porvir, mas com a paleta de cores que vemos diante dos olhos sobressai uma Europa vetusta: a Europa em que sobrepesam os egoísmos dos países.
É a Europa que temos. Não é a Europa que quadra com o tempo dos idealismos. Eis a revelação maior destes tempos excruciantes: o idealismo europeu não consegue medrar.
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