8.11.12

É coragem, ou é loucura?


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Pode ser recalcamento que sobra da infância: ninguém gostava, nem admitia,  que a covardia fosse seu pergaminho. Pode ser apenas afirmação pessoal, um desvario inconsequente para exibir o desassombro que não é para qualquer um. Às vezes, a mania de que somos de uma bravura singular. Achamos que os outros nos admiram pela irreverência que se transforma em coragem. Seja física, ou apenas a coragem que se esgrime na ponta dos dedos, à medida que eles desenham palavras que gritam uma audácia. É um exibicionismo estéril. Uma adolescência extemporânea. São frequentes as exibições gratuitas de coragem. São gratuitas porque, como exibições, são uma vaidade para fora. É como se a coragem interior apenas fosse afivelada se os outros a testemunharem. Se não tiver audiência, a coragem desfaz-se na irrelevância que o não devia ser: a irrelevância de quem foi audaz; mas a irrelevância errada, pois é o apoucamento de si mesmo. Com tanta urgência em ostentar destemor, os foliões da bravura perdem o siso. Por entre a penumbra da ilusão, a coragem não é coragem. Passou a fronteira da loucura. São atos destemidos, só ao alcance de quem misture muita coragem com uma dose de demência não detetada, um cocktail às vezes fatal. As provocações podem arejar a autoimagem e cozer o mercúrio do termómetro, tanta a altivez que se decompõe em fervura. Os sentidos, nessa altura, escondem-se na cortina baça da imprudência. Asnear passa a ser método quando ficou para trás a fronteira entre a coragem e a loucura, os pés já calcorreando os lodosos terrenos da loucura. A coragem deixa de estar emparelhada com a lucidez. Tememos. Pois amiúde a demência é um estado sem reversão. E, à laia de não sermos enterrados no lodo demencial, acantona-se a coragem num lugar recôndito da ação. É quando regressam os pueris fantasmas de outrora: ninguém gosta de levar em cima com o rótulo de covarde.

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