Lince, “It Feels Like Looking at Sculptures”, in https://www.youtube.com/watch?v=iIxgG7ONwNk
Confecionamos a maresia à nossa medida. Dantes, as paredes eram apenas paredes. Obstruções completas; na melhor das hipóteses, uma delimitação contra território exterior, áridas paredes. Agora, as paredes são oportunidades de janelas. De onde o olhar se projeta para o exterior, em não intrusivo movimento, saciando a sede de conhecimento dos lugares que se depõem a nossos pés. Sim: transfiguramo-nos imperadores dos lugares esses. (Outros poderiam ensaiar semelhante reivindicação, mas não cuidamos de dar atenção a exteriores proclamações.) É de lá que desenhamos a paisagem que se entretece sob o nosso olhar. Somos argonautas das marés que emprestam o odor a cada lugar. Podíamos dizer: trazemos no alforge das memórias um módico (pelo menos) dos lugares que vieram ao nosso conhecimento. Somos mais ousados: os lugares são maiores a partir da nossa presença. Não é exorbitância. Do pináculo da humildade, declaramos a nossa quintessência singular. Não esperamos que seja tributada em seu desalfandegar. De oferendas tais não se espera atividade punitiva. E sim, confecionamos a maresia à nossa medida – e todos os lugares são nossos arquipélagos, de onde se incita a combustão das coisas que importam. Sob o sol da meia-noite, nem que seja em latitudes que não o tenham, ou nas latitudes que nos esperem em devir laudatório. Na nau que desenhamos e de que somos timoneiros, sulcamos os mares a eito, sem medo das marés em convulsão, sem medo das palavras histriónicas ou de fantasmas pretensiosos. No diário de bordo, enquanto emolduramos em palavras honestas o derradeiro sol da meia-noite, tomamos espera no entardecer que nos espera. Não há pressa. O próximo ancoradouro não desaparece. Na viagem de entremeio, concebemos as estrofes com o mel dos lábios que selam as palavras a preceito. São seu guarda-freio, tutela sem recurso no dédalo dos tempos sem memória. Não se poderia esperar diferente de um amor.
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