31.8.18

Second birth (short stories #21)


Massive Attack, “Psyche”, in https://www.youtube.com/watch?v=gU-gz06cJCc
          Uma convulsão telúrica, o corpo arrastado por todos os lados, o movimento sobrepondo-se à vontade do corpo (e à força, sitiada), como se estivesse numa máquina de lavar, atirado fragorosamente contra as paredes de um labirinto escasso. Ou então, na volúpia de um vulcão aceso, com vista próxima para o precipício, sentindo o ar incensado pela febre do vulcão em contínua explosão, e os pés vertiginosamente aproximando-se dos deleites da erupção, sem que nada pudesse fazer para embotar o passo. A preclusão da morte não era incindível: o pensamento não a podia comandar e parecia ficar à mercê dos seus humores. Afinal, era um pesadelo. A armadura pesada adejando sobre o olhar adormecido fora suficiente para acordar banhado em suor. Quase jurava que no epílogo do pesadelo fora ao seu próprio funeral. (Às vezes, em desafio com a morte, precisando escarnecer dos seus descaminhos, desenhava um cenário em que era, por fora de si, parte da audiência do seu próprio funeral. Depressa desistia da ideia – não por temor da morte, ou por ser seguidor do princípio “com coisas sérias não se brinca”; sabia que em todos os funerais há gente compungida, algumas pessoas vertendo lágrimas, quase todas elas – fora as que marcavam presença para descarregar um qualquer dever de consciência – peritas no predicamento de opulentos epitáfios em que só merecem evocação as virtudes do defunto, olvidadas as suas imensas fragilidades. Pois, enfim, a morte traz consigo a exaltação das virtudes raramente reconhecidas em vida, o que torna a vida – vista por este prisma – uma inutilidade.) Limpando o suor abundante do corpo, e enquanto preparava nova muda de roupa por até os lençóis estarem banhados em suor, percebeu que a derrota do pesadelo era um segundo nascimento. Com tudo de mau que os segundos nascimentos comportam: juras de fidelidade à mudança de maus predicados para bons em sua substituição, como se tamanha mudança estivesse ao alcance de uma simples promessa. Antes não tivesse sido cativo de tamanho pesadelo. Resolveu o problema a contento: em higiénico ato, decretou o pesadelo como não acontecido. O segundo nascimento já não era preciso.

Sem comentários: