Neon Indian, “Toyota Man”, in https://www.youtube.com/watch?v=-jvkHxmeNXc
Incongruência de método: exercitava uma irritação emblemática contra os otimistas empedernidos, os que exsudam boa disposição permanente e a ostentam como medalha contagiante. E, todavia, não encontrava os rudimentos para se situar na trincheira contrária. Deplorava o pessimismo metódico. Repudiava os conservadores irremediáveis que militam contra a modernidade (e ele há sempre uma modernidade a tingir cada tempo que passa). Os aflitivos críticos exponenciais eram corpos estranhos, via-os como gente angustiada, consumida pelo seu próprio sangue corrompido pelo veneno que destilam pelos poros.
Era um otimista, por princípio. Sem convicção. Não podia de si dizer que alimentava uma tocha estruturalmente otimista. Se fosse preciso, dava o flanco para admitir que também era assaltado por dúvidas que o colocavam no ermo do pessimismo. Não é com dificuldade que se encontram provas, e não apenas circunstanciais, das náuseas que afeiam o mundo. Ato contínuo, à recordação subiam os indefetíveis do pessimismo (antropológico e de outras estirpes) e depressa suprimia os laivos de pessimismo sob a custódia do seu exigível oposto. Mas não tinha condições para ser um otimista descomprometido. Sentia a exigência de colocar condições ao otimismo, para que o otimismo não caísse no logro da banalidade e não fosse condenado ao esvaziamento por dentro.
Aceitava que dele se dissesse ser um otimista cauteloso. Já era mais do que mera retórica, a posição estabelecida: recusava a decadência do pessimismo, por causa da contaminação dos seus dogmáticos, que considerava gente não recomendável. Tinha, contudo, os desalmadamente otimistas como igualmente recusáveis, por motivos diferentes.
Não era isenta de danos, esta posição. Durante muito tempo, causara-lhe espécie a equidistância, o ponto cardeal que o distanciava, em doses iguais, de cardinais que se opunham. Não alinhava pelo estalão das meias-medidas. Isso era dantes. Agora, já não é um embaraço. Contudo, não aceita ser arregimentado na equidistância entre os abnegados otimistas e os circunspetos pessimistas.
Era um otimista, porque a teoria geral da relativização das coisas (por si cunhada) ensinava que do ponto em que nos situamos temos a possibilidade de testemunhar quem se encontra em pior posição. Este era o incentivo para o otimismo. Um otimismo metódico, não destravado e acrítico, mas acidental. Triunfante por não olhar para o mundo e as pessoas e as coisas que o compõem como uma aguarela sem cores, plúmbea, tristonha, boçalmente decadente. Sabendo, contudo, que não encerra em si um perene e radioso arco-íris, o mundo retratado aos seus olhos.
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