12.11.15

O desbocado

Madness, “House of Fun”, in https://www.youtube.com/watch?v=GJ2X9SANsME
(Com o pensamento poluído pela presença do Arroja)
Já andava calado há algum tempo. Houve tempos em que emprestava a presença ao comentário na comunicação social. Distinguia-se pela empáfia, pelo ar blasé, por um dom de dizer as coisas mais politicamente incorretas (o que, manda a minha verdade dizer, não é coisa má em si) com uma petulância que eriçava a supina paciência dos mais pacientes. Entretanto, desapareceu do mapa público. Talvez quem lhe deu microfone tenha percebido que até o circo acaba quando as figuras abusam do estatuto circense.
Agora regressou das catacumbas. E quando digo catacumbas, não estou (e aqui custa admiti-lo) a apostrofar as ideias do Arroja, que até andamos mais ou menos pelos mesmos apeadeiros. O mal não é das ideias; é de haver um Arroja que se alinhave por elas. As catacumbas são o tabernáculo de onde ninguém devia ter extraído o Arroja. Primeiro apareceu em pose filantrópica, num jantar de beneficência que juntou a clique social portuense sedenta de “reconhecimento social” para angariar fundos para um hospital pediátrico de que o Arroja é patrono. Depois veio ao éter opinar sobre a telenovela política do momento. Não lhe ocorreu melhor, a propósito da adversidade política, se não ultrajar as mulheres do Bloco de Esquerda. Que são “esganiçadas”. Que não as queria para nada – supõe-se, para além do que arrotou em público (que seriam más mães de família, tirando a incrível conclusão a partir da postura política destas mulheres, o que é coisa do mais alto calibre científico), supõe-se que as recusaria se o Arroja fosse um conquistador de corações femininos.
O pobre do Arroja não se vê ao espelho e devia ter perguntado aos seus prescientes botões se por acaso alguma mulher (seja ou não da extrema-esquerda caviar) o queria para alguma coisa. Aquele ar piroso e obnóxio, a jactância concomitante, a assertividade argumentativa (quase como quem diz “está visto que é como eu digo e só quem é ignorante ou está de má fé é que não me dá razão”), os não kantianos imperativos categóricos, a saloiice irremediável, e – volto ao início – aquele aspeto pacóvio que nem a indumentária decerto dispendiosa consegue atabafar: eis o Arroja, o antíctone do que alguma vez eu quereria ser se porventura não gostasse de ser quem sou.

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