15.10.04

A polícia de segurança pública e a caça aos justos

Há semanas que encontrar estacionamento no local de trabalho é uma tarefa que pode levar ao desespero. Em anos anteriores, por vezes acontecia andar às voltas em busca de um lugar para deixar o carro. Quando a sorte não me bafejava e a hora de uma aula se aproximava, tinha que deixar o carro parado em locais proibidos. As multas eram inevitáveis. É um caso de pagar para ir trabalhar. O preço da civilização, sobretudo quando se observa a quantidade (e a qualidade) do parque automóvel da comunidade estudantil.

Neste ano o panorama piorou. Já por três vezes deparei com o espectáculo montado pela polícia (penso que se trata da polícia de segurança pública) na parte superior do jardim de Arca d’Água. É verdade que existe uma linha amarela que proíbe o estacionamento junto ao passeio do lado direito. Perceber a razão da linha amarela naquele local é um mistério impossível de decifrar. Os automóveis podem estacionar de ambos os lados da rua sem perturbarem o trânsito. Em anos anteriores, a polícia mostrou-se condescendente com a infracção à misteriosa linha amarela. Sempre tapou os olhos, ano após ano, ao estacionamento naquele local.

Um belo dia, pela manhã, havia muitos lugares livres naquele local. Estranhei a fartura. Como a hora da aula se aproximava, parei o carro num desses locais. Quando me encaminhava a pé para a entrada da universidade percebi a razão da abundância: a PSP estava a fazer uma razia. Todos os carros que ainda estavam parados já tinham bloqueadores presos às rodas. Esperava-os o reboque e uma multa generosa. Os lugares vagos pertenciam a pessoas que tiveram a sorte de ser avisadas da visita intempestiva da polícia, ou a automóveis que entretanto já tinham feito a viagem até ao parque da polícia à boleia do reboque. Recuei e fui retirar o carro para um lugar seguro.

Nas duas semanas seguintes este espectáculo repetiu-se por mais duas vezes. Uma autêntica caça à multa, com o estendal montado em pleno jardim: uma carrinha da polícia com banca instalada, um toldo para proteger os senhores guardas da inclemência atmosférica, que o Outono é uma estação imprevisível. Uma fila de estudantes, esperando para mostrar a documentação, antes de os guardas de serviço passarem amavelmente a multa e indicarem aos infractores o local onde o carro está depositado. Uma encenação que tresandava a abuso de autoridade.

Há dias, num fim de tarde depois de voltas sucessivas até encontrar um longínquo lugar para estacionar, cruzei-me com os arrumadores que costumam parar no local. Perguntei se os locais vagos na zona que é alvo do apetite policial eram seguros para estacionar. Na verdade, só tinha testemunhado as simpáticas visitas da PSP durante a manhã. Nunca durante a tarde e muito menos à noite – que os senhores agentes são pais de família e a noite não é hora decente para se trabalhar…Os arrumadores disseram-me que o perigo só existe de manhã. A PSP fecha os olhos a quem quiser desrespeitar a linha amarela durante a tarde e a noite. Perguntei se sabiam as motivações desta insólita perseguição policial. “Sabe como é, são as guerras entre a polícia e o reitor”, foi a resposta.

Fiquei elucidado. É esta a polícia que temos. Entretida em guerras pessoais com o reitor, quem apanha por tabela são os professores, funcionários e alunos que têm o azar de trabalhar e estudar na universidade dirigida pelo reitor-inimigo. Paga o justo pelo pecador. Com a agravante de que estamos a falar de pessoas que usam o automóvel para darem o seu contributo para a criação de riqueza nacional. Como se já não bastassem os impostos que levam uma parte substancial do suor derramado ao fim de cada dia, estas pessoas são ainda brindadas com uma polícia persecutória que não hesita em subtrair mais uma parte do rendimento que o trabalho lhes proporciona – ou encarecer mais ainda o estudo, adicionando as multas às propinas que os estudantes pagam.

Em vez de se preocuparem em perseguir quem não está a cometer nenhum crime, mas apenas a contribuir para o rendimento nacional, a polícia devia ter a dignidade de não molestar os alunos, professores e funcionários como vítimas fáceis das desavenças com o reitor. É mais fácil atingir quem está mais a mão – até porque não podem multar o reitor, pois ele estaciona o carro no parque subterrâneo da universidade (só para privilegiados…).

A polícia prestaria um inestimável serviço público se perseguisse o crime que se comete com abundância pelas redondezas. Em vezes de distribuir multas de estacionamento a torto e a direito, que tal patrulhar a zona para evitar os assaltos que se sucedem todos os dias? Ou será que a polícia prefere atacar os alvos mais fáceis, fechando os olhos às tarefas mais difíceis? Que polícia com pobreza de espírito: os verdadeiros criminosos passam impunes, e quem não ameaça a segurança pública é o alvo preferido da acção policial! É para isto que pagamos impostos?

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Paulo,

Apesar de não ser este o tema do dia, gostaria de apresentar, publicamente e como amigo, as minhas felicitações pela nova etapa que deste no dia de ontem. O nascimento de um ser humano é sempre uma grande alegria para os pais e para todos nós, amigos.
Desejo aos três muitas felicidades.
Batido