As cintilantes personagens que vertem lágrimas por cada atentado ao meio ambiente não percebem a incongruência em que se metem quando acusam os países pobres de serem fautores dos mais graves danos ao ambiente. Estes ecologistas de pacotilha, sem o perceberem, fazem o jogo dos países ricos quando acusam os países pobres de estarem na idade média da preservação do meio ambiente. É neste contexto que se discutem as externalidades ambientais psicológicas.
Por estranho que pareça, há uma ligação estreita entre ambiente e psicologia. É o que acontece quando os países ricos congeminam uma hipócrita estratégia de erguer o dedo contra atentados ambientais perpetrados por países pobres. Alguns exemplos: a fabricação de cosméticos que se serve de experimentações cruéis em animais que permanecem em cativeiro; a produção de medicamentos inoculados em cobaias, para se perceberem os seus efeitos antes de serem lançados no mercado. O avanço tecnológico conhecido nos países ricos dispensa crueldades em animais. Os países pobres vivem à míngua de capital; não têm condições para investir nas tecnologias mais avançadas. Persistem nas condenáveis práticas que sacrificam animais inocentes em nome do bem-estar humano.
As autoridades dos países ricos apelam à consciência dos consumidores. Orquestram campanhas que funcionam como coacção psicológica junto dos consumidores. A intenção é chamar a atenção para as crueldades impostas a animais, enfatizando o anacrónico da situação em pleno século XXI, agora que a ecologia conquistou primazia junto dos corações. As autoridades dos países ricos são acompanhadas pelos arautos do ambientalismo, sempre na linha da frente quando se trata de defender a preservação do meio ambiente.
Nos países ricos, por detrás da argumentação ambiental – e da persuasão psicológica que penetra, indelével, no subconsciente de desatentos cidadãos – encontra-se o receio de que a concorrência acrescida possa destronar as empresas de países ricos do protagonismo a que estão habituadas. A entrada de empresas de países pobres, que alicerçam a sua competitividade na dispensa dos padrões ambientais mais rigorosos dos países ricos, é uma séria ameaça à hegemonia das empresas destes países. A perda de quotas de mercado convoca à reacção defensiva das autoridades dos países ricos. Uma reacção encapotada, escondida detrás da sensibilidade ambiental atormentada pela insensibilidade dos países pobres.
A hipocrisia dos países ricos é visível à vista desarmada. Primeiro, reagem não por estarem preocupados com os atentados ambientais, não por serem sensíveis aos direitos dos animais, não por manifestarem repulsa pela brutalidade exercida em criaturas indefesas. Aliás, os países ricos não podem aparecer como advogados de defesa dos animaizinhos: basta relembrar quem encabeça o comércio de peles dispendiosas que madames envaidecidas envergam para se protegerem dos rigores do frio invernal.
Segundo, a hipocrisia está também no tipo de reacção dos governos dos países ricos. Recusam-se a reagir frontalmente contra as vantagens adquiridas por empresas de países pobres à custa dos atropelos ambientais. Em vez disso, endossam a responsabilidade aos consumidores, habilmente instruídos a não comprarem os produtos vindos de países pobres que desrespeitem os standards ambientais modernos. Sem coragem para imporem uma reacção directa, que contrabalance as vantagens artificialmente conquistadas pelos países pobres, os governos dos países ricos ficam-se por meias medidas, convidando os seus consumidores a um embargo implícito aos produtos dos países pobres.
Terceiro: compreende-se a falta de coragem dos países ricos. Num passado não remoto, eles foram pródigos nas mesmas técnicas deploráveis que agora censuram. Não têm legitimidade para acusar os países pobres, porque a pedra lançada estilhaça-se nos seus próprios telhados. Daí que empurrem o ónus da reacção para o cidadão comum. Que é laboriosamente educado a ser uma pessoa responsável perante os crimes ambientais que se observem mundo fora. Com o cuidado de abafar os atentados ao meio ambiente que se continuam a cometer no próprio país, afastando as atenções para os desmandos além fronteiras.
Os amigos do ambiente, tantas vezes alistados nas fileiras dos detractores da globalização (e, portanto, denunciam os países ricos e o capitalismo que servem), não percebem que a cruzada ambientalista os coloca como aliados dos países ricos. E não percebem que os países ricos estão desprovidos de razão quando incutem nos cidadãos a responsabilidade de não comprarem produtos que dependem de métodos que sacrificam animais. No passado eles fartaram-se de fazer o mesmo. Se os países pobres fossem impedidos de produzir com estes “métodos ancestrais”, talvez deixassem de produzir e de gerar riqueza. Com uma consequência que não deve ser do agrado de ninguém: ficarem ainda mais pobres.
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