Palavra de honra. O que seria da política internacional sem as animações circenses de Berlusconi? Um marasmo. Um exagero de cinzentismo, com os figurões todos bem compostos, todos os gestos e palavras bem estudados, sem o menor desalinhamento. Uma coisa muito asséptica. E artificial. Ao menos, com o apatetado primeiro-ministro italiano temos episódios que dão direito à gargalhada. Quem, no seu juízo, se pode queixar de quem lhe provoca boa disposição?
É certo que das esquerdas aparecem logo umas vozes revoltadas contra a imbecilidade de Berlusconi. Percebe-se a indignação dessas esquerdas. Uma indignação conveniente. E enviesada. Pois essas vozes silenciam-se – num ensurdecedor silêncio – quando outros palhaços de serviço que estão mais próximos dessas esquerdas fazem declarações apalermadas, ou aparecem em tristes figuras.
Berlusconi é um exemplo perfeito de incontinência verbal. Já o disse aqui num texto anterior: se houvesse apenas uma direita, porventura a vergonha da direita e o trunfo ideal das esquerdas (e, todavia, continua a ganhar eleições em Itália…). Quando há cimeiras internacionais Berlusconi quebra as solenidades e, em ruptura com o pesado protocolo, prega partidas aos seus colegas. Há tempos, na habitual "fotografia de família" que é tirada em cada Conselho Europeu, Berlusconi foi apanhado a desenhar com os dedos uns chifres na cabeça de Gordon Brown (se a memória não me atraiçoa). O vídeo que dá o mote a este texto é todo um programa de humor. Passou-lhe uma coisa pela cabeça e, para surpresa geral, simulou a cópula com a agente policial que, incrédula, ficou sem reacção.
Razão tinha Roberto Benigni quando disse, há dias, que Berlusconi é o maior palhaço de todos. Que me perdoem os esquerdistas muito ofendidos, mas nem eles percebem como Berlusconi é uma dádiva divina para a sua causa (se eu e os esquerdistas acreditássemos em entidades divinas). De cada vez que resvala para a imbecilidade, ao menos as ressentidas esquerdas sempre têm motivo para destilar toda a crítica e apoucar o primeiro-ministro italiano. A oportunidade ideal para catequizar os eleitores italianos, mostrar-lhes como é impensável continuarem a ter um primeiro-ministro que apenas se destaca na arte circense e na vergonha que se abate sobre toda a Itália. Infelizmente para os meirinhos dessas esquerdas, a maioria dos italianos é de uma ignorância tremenda.
Mantenho a ideia: os italianos que escolhem Berlusconi sabem o que fazem. Prestam um imenso favor ao resto do mundo, que se diverte com os malabarismos da inefável figura. Seria enfadonho se apenas tivéssemos líderes muito sérios, de sentimentos impenetráveis, sempre imersos na pose grave que as muito sérias funções exigem. Entenda-se: isto não é uma apologia de Berlusconi. Se fosse eleitor em Itália votava em Berlusconi? Não. E muito menos votava no mosaico de esquerdas. Que, apesar de não escorregarem para o chinelo, não cativam maior confiança do que Berlusconi.
Mencionar o primeiro-ministro italiano e a sua vocação circense traz uma ponte com a realidade caseira. Por cá temos direito a um sucedâneo de Berlusconi: Santana Lopes, esse cadáver político (caso esta fosse uma terra normal). Ambos comungam de uma característica: meteram na cabeça que são mulherengos. E ambos são do melhor que um circo ambicionaria ter ao seu serviço. Acabei de saber que Lopes, na apresentação da sua candidatura à câmara de Lisboa, pediu a ajuda de deus para ganhar as eleições.
Ora, acho essa invocação uma deslealdade em relação aos candidatos rivais. Então deus só vai ajudar o Lopes, deixando de estender uma mão ao Costa, ao Ruben, à Helena e ao candidato que a esquerda caviar vier a apresentar? Que se saiba, deus é justo e imparcial. Recto nas escolhas. Se deus anda atento às disputas eleitorais pelo mundo fora (o que é duvidoso), não pode inclinar as suas preferências para um determinado candidato. Ou deixaria de poder chamar a si os predicados divinos que corporizam a sua interminável bondade. Donde se conclui que o Lopes ou é ignorante ou anda desatento dos mandamentos católicos. Até se pode equacionar uma terceira hipótese: o Lopes devia saber que deus anda muito atarefado com a monstruosa crise que nos consome, dando uma mão aos grandes e prescientes líderes mundiais que a combatem. Vai lá deus ter tempo para as minudências de uma eleição autárquica num recanto insignificante do mundo…
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