(Contém alguma linguagem "inapropriada")
Há-as de duas categorias. As solteironas inadiáveis. E as divorciadas em lamentável carpideira pública da desgraça que as abraçou. Pulam, em saltinhos histéricos, cheias de energia. As primeiras, como se vagueassem numa eterna juventude que promete o até agora inalcançável. As segundas, farejando qualquer possibilidade de retomarem o que deixaram de ter porque os antigos consortes decidiram debicar noutro galinheiro.
Não param quietas. Desmultiplicam-se em actividades, o sono adiado para os dias em que, por fim, o sossego de espírito e a acalmia dos prazeres tiverem ancoradouro (se esse dia não for uma miragem). Aquilo é um covil onde as hormonas ardem, numa incandescência que se nota à vista desarmada. Quando era mais jovem (mais jovem do que o sou hoje, bem entendido) e tinha paciência para ocasionalmente meter um pé na vida nocturna, havia um sítio da preferência dos meus amigos onde todas as valquírias marcavam encontro: o "Buffalo's", em Matosinhos.
Era impossível estar sossegado. Ir sozinho ao bar era uma aventura. Enquanto esperava pela bebida, não demorava um minuto, um minuto sequer, e aparecia uma trintona ou umas quarenta invariavelmente voluptuosas – e, por vezes, até acontecia aparecer uma de cada lado. À espera que metesse conversa, que elas podem estar esfaimadas mas nisto mantêm-se arreigadas aos costumes de antanho: são os varões que metem conversa. Na esperança, sobretudo delas, que mais tarde se meta outra coisa. Não sei se seria do meu bom aspecto (momento José Mourinho), mas estar momentaneamente desacompanhado na ida ao bar garantia célere companhia de uma qualquer valquíria sequiosa dos meus potencialmente excelentes serviços. Apercebi-me então do efeito revertido do que sentem as donzelas quando são comidas com os olhos pela homenzarrada por que passam: carne para canhão. E se muitas eram autênticos canhões!
As incursões junto do bar eram um exercício curioso, a tal ponto que comecei a fazer apostas com os amigos que me acompanhavam. À custa destas apostas ganhei algumas bebidas de graça (e mais não posso dizer). E eu, que não sou paneleiro – bem pelo contrário – era assaltado por sensações paradoxais. Se aquilo fazia bem ao ego, por outro lado notava a intimidação pelo assédio sempre silencioso das valquírias que se acercavam. Foi então que descobri, tardiamente, uma ingenuidade que não é destes tempos.
Deixei de ser visita da vida nocturna. Perdi o rasto à militância das valquírias com hormonas aos saltos (para não dizer outra coisa). Às vezes, dou de caras com tias prometidas ao celibato e outras que, carpindo mágoas de divórcios mal digeridos, acreditam que o tempo recuou e que retomaram uma pós-adolescência perdida nas ilusões do matrimónio com o que julgavam ser o seu príncipe perfeito (entretanto alcandorado ao estatuto de fariseu da pior espécie). As circunstâncias influenciam os momentos: já não as vejo trajando vestidos justos, na ostensiva saliência das carnes pouco cuidadas, daqueles vestidos que oferecem regaço a amplos decotes que sugeriam à masculina caça onde podiam mergulhar a sua libido. À luz do dia, paramentos mais discretos. Mas cheira, na mesma e à distância, a hormonas aos saltos. Irrequietas, parecem pular em cima de uma inesgotável bola de energia. A espécie mais notória é a das valquírias extrovertidas, as que multiplicam amizades no exacto minuto em que conhecem um estranho por quem imediatamente se encantam. Vão daqui para ali, sempre desejosas de conhecer mais e mais gente. A lei das probabilidades estatísticas explica o aumento das possibilidades de sucesso quando se amplia a amostra (de conhecimentos).
Todavia, esta lei matemática defronta-se com um obstáculo, dir-se-ia, um insondável imponderável: quanto mais perseveram, e quanto mais as hormonas aquecem junto ao ponto de fervura, menos lhes acontece aquilo que tanto desejam. É como se funcionasse uma lei repulsiva: de tanto ostentarem a lascívia impraticável, mais afastam os potenciais caçados. Um azar tremendo. Que deixa as desgraçadas das hormonas a pular, e muito, mas entregues à sua solidão.
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