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Rodrigues, o açoriano deputado socialista, mete ao bolso dois gravadores dos jornalistas que – ó coisa inadmissível – dispararam uma pergunta incómoda. No dia seguinte Rodrigues convoca uma conferência de imprensa. Sem direito a perguntas dos jornalistas, ou não fosse dar-se o caso de ter que repetir a façanha. Justificou-se: foi perante a “pressão psicológica insuportável” que teve que deitar mão (literalmente) à “acção directa”. A seita socialista aplaudiu e solidarizou-se. Estranho seria se fosse o contrário.
(Aliás, em parêntesis, o apoio de casta devia entrar para o manual dos comportamentos exemplares. Quando pertencemos a um grupo, devemos proteger os que são um de nós. Sempre. Que interessa que um dos nossos tenha deslizado para a asneira? Ai de nós se estivéssemos sempre a crucificar os que da seita fossem acometidos por uma súbita branca de comportamento; nunca nos seria dado o benefício da dúvida, teríamos que ser gente desumanizada, daquela gente que nunca, mas nunca, pisa o risco onde já está o erro. Por isso fiquei comovido com a solidariedade imediata da seita socialista. Outro exemplo para um manual qualquer: como o algoz se desembrulha na condição de vítima.)
Também fiquei sensibilizado com a cambalhota semântica usada para o perdão canónico que toda a pátria devia estar obrigada a conceder ao deputado Rodrigues. Coitado do homem, estava ali diante de dois bandidos jornalistas que vasculhavam o seu passado, digamos, menos claro. O senhor deputado sentia-se acossado pelas insidiosas perguntas. Foi aí que decidiu terminar a entrevista e palmou os dois gravadores que registavam a dita cuja. É nestas alturas que uma pessoa desalmadamente cínica não resiste a formular esta interrogação: afinal aquele insólito nervosismo não denunciou o deputado Rodrigues? Há perguntas muito incómodas, deveras; mas, lá diz o povo (que em maioria elegeu o deputado Rodrigues e comparsas), “quem não deve não teme”.
Com um riso sardónico a povoar o rosto, avanço o seguinte: pior seria se o deputado Rodrigues tivesse ido às trombas dos luciferinos jornalistas. Seria altura para resgatar a cartilha de um famoso “ideólogo” daquela seita, agora retirado em compensador cargo numa empresa de construção civil que tem muitas obras públicas pela frente, quando ameaçou “quem se mete com o PS leva”. Há manifestos exemplos de “dar” (o antónimo de quem “leva”). Socos, pontapés, insultos, telefonemas a pedir que não se publiquem notícias, silêncios comprados com uma qualquer sinecura. Ou gravadores retirados aos jornalistas em plenos paços parlamentares.
Mas o que me encheu as medidas foi a ditirâmbica explicação do que passou pela cabeça do deputado Rodrigues: “pressão psicológica insuportável”. Como pretexto para a “acção directa”. Vamos pelo fim desta muito criativa relação causal. O deputado Rodrigues acredita em argumentos de autoridade. Assim como assim, trata-se de um deputado, e um deputado da nação é gente inteligente com o dom da palavra e do raciocínio. Além disso, o deputado é jurista. Terá a seita socialista acreditado que isto chegava para encerrar o assunto. Como em todas as profissões (deputados e juristas incluídos), há profissionais de meia tigela. Mete dó a indigência desta gente: nem sequer lhes passou pela cabeça que haveria juristas afamados que se apressaram a negar o conceito de “acção directa” naquele caso. Como disse um catedrático da área, se fosse um aluno a empregar o conceito perante aquelas circunstâncias, era aluno chumbado.
Ora como se diz que os senhores deputados dão o exemplo, ao menos aprendemos que de agora em diante o mínimo laivo de “pressão psicológica insuportável” estende a passadeira ao crime sem punição. Se eu fosse juiz, nunca mais tinha argumentos para condenar um criminoso sentado no banco dos réus. Com um advogado diligente a acenar com a “pressão psicológica insuportável”, tudo seria consentido. Aliás, argumento que as extremas-esquerdas endeusam (ai, a violência nas ruas de Atenas, legitimada pela criminosa austeridade do governo).
Quanto ao deputado Rodrigues: se não sabe aguentar a “pressão psicológica insuportável”, deite-se do divã de um psiquiatra.
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