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Desconfio que o novo ministro da economia vai ser tratado como cão sarnento, pois teve o atrevimento de se virar para os jornalistas e, com elevada familiaridade, solicitou que o tratassem por “Álvaro”. Que se deixassem dos salamaleques e guardassem o respeitoso tratamento “senhor ministro” para quem faz questão de puxar lustro à ministerial medalha. E depois explicou ao que ia: quando era estudante teve professores que exigiam que os tratassem pelo primeiro nome.
Já deu à costa o habitual coro de gente muito séria que se atirou à informalidade do senhor ministro (perdão, do Álvaro). Que não se pode tratar o senhor ministro pelo nome próprio, que isso belisca a autoridade de um governante. Uma luminária houve que se deitou a inventar o cenário guloso da desautorização do ministro, ao imaginar o motorista, todo tu-ca-tu-lá, a virar-se para o ministro, tratando-o por Álvaro, convidando-o para um café ou uma cervejola de final de dia.
Eu, que não confio por aí além neste novo governo (e mais razões tenho para montar a tenda do cepticismo ao saber da extorsão fiscal que aí vem sobre o subsídio de natal), admito que já quase heroicizei o Álvaro e ele nem começou a provar a estirpe de governante. Esta tirada à frente dos jornalistas é um terramoto. E se o primeiro-ministro escolheu para ministro da economia (e de mais um punhado de coisas que não me recordo agora) um académico desterrado no Canadá, mereça (a custo) um aplauso só por ter descoberto um ministro que detesta formalidades excessivas e genuflexões acessórias.
Dizem que temos a mania dos penachos e que o “doutor” ou “engenheiro” que precede o nome é caução de identidade quando nos apresentamos a alguém. Alguns, com experiência profissional, revelam que somos motivo de chacota por causa desse pretensiosismo. Esfregar na cara dos outros a credencial académica é sinal de pequenez. Esta gente que se exporta da academia para o poder faz questão de adicionar ao título académico o tratamento que nobilita o poder que aterrou nas suas mãos. Suponho que lhes acomoda o imenso ego. Deve ser quase orgástico, no sentido de se encherem de arrepios quando os subordinados ou os simplesmente súbditos se desfazem em mesurices. Gostam de ser pajeados.
O Álvaro aprendeu a tradição anglo-saxónica do tratamento informal. Para o contexto que somos (e que ele, tão à distância, terá esquecido), dizer aos jornalistas, e por seu intermédio ao resto da populaça, que o devem tratar por “Álvaro” é uma heresia. Quem vai respeitar um ministro que autoriza os jornalistas a chamá-lo pelo primeiro nome? Os quadrados do regime e as avantesmas da função pública devem andar indignados com o Álvaro. Ele faz lá sentido que a gentalha comece a tratar os ministros pelo nome próprio? Qualquer dia, ministros tão informais são apanhados em manifestações populares (por exemplo, no arraial montado pelo patrão da Sonae), ou a exigirem que os subordinados os tratem pelo nome próprio, abrindo as hostilidades de um tratamento informal que não se sabe onde irá parar. É que, como se costuma dizer, somos vezeiros em tomar o braço quando nos deram um dedo.
Eu cá prefiro virar-me para o ministro da economia (e de mais um ror de pastas) e tratá-lo, ainda que sem o tu-cá-tu-lá, por Álvaro. É preciso arejar os costumes.
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