19.7.11

Convulsões


In http://revistadeciframe.files.wordpress.com/2010/06/labirinto_da_vida.jpg
Com a sobranceria dos convencimentos estéreis, pensava que encontrara o pensamento altaneiro. Pensara: que aquele zeloso pensamento fecundara as palavras num encadeamento a que se chamaria literatura. Coitado, pariu uma rocha.
Quando deu conta do malogro, ensimesmou. Os que destruíram em meia dúzia de pareceres aquilo que julgara obra-prima eram algozes injustos. Ao início, atirou-se como um mastim à altivez dos algozes. As noites primeiras eram de insónias brancas, como se à frente dos olhos apenas passasse uma luz alva rompendo a escuridão que se demorava na noite. E assim que o cansaço substituiu as insónias que não clareavam a lucidez, o sono atormentado fez suplicar pelas insónias que, ao menos, não eram tão impuras.
A lógica sucumbira aos labirintos onde as paredes se atiravam, ensandecidas, contra o corpo indefeso. As nuvens amontoavam-se numa sofreguidão ímpar. Depois desfaziam-se numa claridade quimérica, uma claridade que povoava o horizonte com um azul fúlgido e infecto. Todas as coisas tinham sido apoderadas pela cauda cruel de uma besta que palavras nenhumas conseguiam descrever. Todas as coisas, as palavras atreladas, corriam desenfreadas sob a batuta de uma divindade contumaz. A meio do tenaz labirinto, uma porta impecavelmente amarela convidava ao retiro dos corredores demenciais. Assim que a porta se abriu, tanta a comoção pelo apaziguamento que se prometia e nem reparou que não havia chão firme. Do outro lado da porta só havia um precipício.
Um zunido estridente ecoava pelas ranhuras da janela. Demorou a desligar-se do sono. Esteve uns demorados momentos imerso na letargia. Era como se fosse um limbo, ainda convencido que o pesadelo soez se metera pelos interstícios da existência. Mas era um pesadelo. Os lençóis ainda destilavam as sobras do suor vertido. O sibilo, repetido quatro vezes, partira do camião do lixo que, se pudesse, abalroava um automóvel mal estacionado. Precipitou-se no beiral da janela, abrindo-a para deixar entrar o ar fresco da alvorada. Estendeu o braço para os impacientes homens do lixo, em jeito de agradecimento.

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