23.11.11

As sobras das palavras vãs


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No mesmo dia: um elogio que fez corar; e um sussurro ao ouvido que trouxe palavras ditas por outros, palavras que depuseram uma coroa pungente. Palavras ainda por cima infundamentadas. E o que fez o pensamento? Longamente debater-se nas palavras do incómodo. Já sabia que os elogios eram outro incómodo. Um embaraço talvez explicado pela irremediável timidez, ou porque os expoentes de narcisismo que se afadigam pela visibilidade geral o exasperam. Mas naquele dia as elogiosas palavras logo foram arquivadas na irrelevância quando soaram as palavras com sabor a pessoal desprazer, o amesquinhado julgamento digno de coscuvilheiras que só sabem curar dos interstícios da vida alheia.
Quando houve mercê de alguma acalmia e resgatou a lucidez, percebeu a aleivosia a si mesmo. Não seria preciso beijar os contrafortes do narcisismo – estava convencido, desde os alicerces que amparavam a sua verticalidade, que de muitos privados vícios o egocentrismo não lhe era apontado. Talvez fosse esse o mal. Porventura devia descobrir os segredos que ensinassem a olhar demoradamente para o umbigo. Para aprender a dar valor a si mesmo, desvalorizando, de uma vez por todas, as imagens de si projetadas por outros.
E o mal maior é que se fartava de pronunciar diagnósticos que, contudo, não se reviam no comportamento. Proclamava que os outros eram indiferentes. Na hora H, as palavras desconfortáveis que os outros de si diziam ecoavam com punhais fundamente cravados na carne, ensanguentando-o demoradamente.
Havia uma higiene mental inscrita na rota das promessas vindouras: aprenderia a afogar a carestia do incómodo semeado pelos demais que não tinham serventia. Aprenderia a acomodar num sótão escuro e inacessível essas palavras vãs por alguém sussurradas ao ouvido. Ele há tantas coisas mais úteis, palavras emproadas no prazer dos sentidos, e a certeza de que por muitos que sejam os anos da existência eles ecoam a injusta sentença divina (caso os houvesse, deuses) de abandonar a sempre tão curta existência ao desaproveitamento das palavras sem merecimento.

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