29.11.11

Rendição


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Paninhos quentes em vez de facas afiadas. Diziam-lhe: não alimentes o afogueamento de ti em esperas inúteis, os dias adiados um atrás do outro como se uma qualquer alvorada desatasse uma solução inesperada. Paninhos quentes, pois. Para o envelhecimento precoce não espreitar à primeira rima quebrada.
Os conflagrações roubam anos de vida – dizia-lhe com a voz suave que, todavia, podia esconder promessas ocultas. Desmembrou-se toda a desconfiança diante de si. E se aquelas palavras balsâmicas fossem uma armadilha? E se estivesse a ser hipnotizado para capitular? A cilada podia não ser a intenção. Mas a desconfiança em redor, amadurecida com os sucessivos agravos em que caíra, articulava por dentro. E, todavia, pesavam aquelas palavras sussurradas ao ouvido enquanto os olhos marejavam. Pesavam à hora do deitar, quando uma insónia tomou o lugar do sono mercê da proposta de rendição que se insinuara.
Sobrava o orgulho. A ausente vontade de dar o braço a torcer. Nem que a perpetuação dos sobressaltos desfiasse o tempo, o tempo já em demasia, deitado fora. O orgulho, o maldito orgulho, inerte no firmamento das intenções. Era um castelo pétreo, as ameias tão altas que nem admitiam o olhar dos curiosos. As pedras cheias de musgo impediam a travessia. De repente, um feixe de luz entaramelava-se numa reentrância entre duas pesadas pedras montadas na muralha. A teimosia haveria de ceder numa das pontas. De tanto esticada, a corda era uma frágil deposição de si mesma. Não era difícil desensarilhar os nós sobrantes. O feixe de luz ecoava numa paisagem mental: e se a rendição fosse o segredo destapado pela última ponta depois de desembaraçada do seu nó final?
O orgulho, impenitente, continuava a ferver protestos com uma inflamação que incandescia. Era como se fosse uma frágil embarcação nos revolvidos braços de ondas tumultuosas que esbarravam umas contra as outras. O palco era medonho. E as ideias, esportuladas em dois hemisférios, demoravam a repousar num dos regaços. Mas a rendição já não era uma impossibilidade. Só faltava que as fortificadas muralhas do orgulho cedessem.

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