8.11.11

O beijo


In http://pekdek.com/fotos/2010/05/beijos-de-famosos-em-filmes.jpg
Saberás que um beijo é um poema tingido de saberes. Saberás. Que um beijo, pela calada da noite, afugenta o frio campestre que enxameia as estrelas. E que esse beijo revolve o vácuo por dentro, caldeia-se em epiderme arrepiada, destruindo os sobressaltos em ebulição. É ouro puro que se depõe em todo o corpo.
Dizia-lhe, incessantemente, que os beijos arremetem contra a macilenta cor dos dias que não se interrompem na sua rotina. Os beijos, dizia-lhe, acabam por ser iguais uns aos outros. E, todavia, na sua semelhança vertem-se sempre diferentes. Pelos beijos decantam-se as palavras que ficam pendentes no deleite do gesto. Beijos tradutores das palavras que as vozes não sabem dizer. Aquelas palavras que se pressentem. As que rasgam a monotonia dos dias. Pressentem-se, essas palavras, embebidas no silêncio. Não são para serem pronunciadas – pensava, temerário, adivinhando-se desastrado na formulação em viva voz das palavras que desfilavam diante dos olhos fechados. Os poemas imaginados abortavam à boca de cena. Pelo imperativo de um beijo.
Os beijos alimentam o regaço aquecido onde as mãos acariciam os longos cabelos emaranhando-se entre os dedos. Esses beijos são a combustão dos instintos. Os lábios carnudos que sussurram promessas de volúpias interrompem os devaneios e repousam nos lábios outros. Detêm-se, langorosos, numa maresia que funde os olhos, uma alquimia que aprecia uma perenidade em instantes efémeros. São os beijos que irrompem na escuridão e transportam a candeia que ensina o que tem préstimo. Os calafrios rasgam o silêncio à medida que um beijo atrás do outro desordena os sentidos.
Em resposta, dizia-lhe: “não passo sem os teus beijos”; notava os olhos marejados. Olhassem de fora e diriam, com desdém, que era filme em modo comédia romântica. Mas os beijos só são sentidos por quem os depõe. Os calafrios misturam-se com as palavras embelezadas que têm seus porta-vozes nos beijos – ora dóceis, ora em arrebatamento. Naqueles fugazes instantes transformados em perenidade, era tudo o que importava.

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