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Mote: não se brinca com coisas
sérias? (Um par de exemplos: a religião, a revolução de abril)
Não se faz. Os capitães de abril
(e um par de oportunistas políticos em adjacência) estão furiosos com o
fascismo implícito que se instalou. Já decretaram sentença: isto já não adere
ao “espírito de abril”. Os seus eternos tutores também sentenciaram que os
intérpretes do poder, notórios testas de ferro dos grandes interesses do
capital, vendilhões da sacrossanta soberania, atraiçoaram o povo que vai
penando entre duas levas de austeridade.
Qual é o fundamento da histeria
dos militares? Há ou não eleições? Descontando a abstenção que cresce como
devia crescer o crescimento da economia, governam ou não os mais votados? A
justiça social vai de mal a pior? Deixemos o famoso povo pronunciar-se em
eleições. É mais confiável que a presciência dos militares desde o seu posto de
vigia. Às virgens ofendidas, pouco falta para nos assustarem com um sobressalto
cívico que desagúe em sublevação popular. Seria a sua medida peculiar de
atestar maiorias, o seu peculiar barómetro da democracia.
É pena que o povo, ignaro como é,
escolha quem tem escolhido para mandante das ordenanças do grande capital e dos
interesses exteriores. Isto havia de ser como na Europa: quando há referendos e
o povo não vota como deve ser, repete-se o referendo até votar a preceito. Cá seria
igual com as eleições. Os reumáticos eternos tutores do “espírito de abril”
seriam vigilantes das eleições. Quando não gostassem do resultado, por
suspeitarem que os vencedores são traidores do “espírito de abril”, mandavam
repetir as eleições. A sombra do conselho da revolução, esse epítome de genuína
democracia, ainda se deita todas as noites com os tutores de abril.
Folgo em saber que os ilustres
militares estão no regaço da reforma. Não os devemos temer: não sairão dos
quartéis com saudades de um novo vinte e cinco de abril (já lá não moram); e a
agilidade física já não tolera aventuras militares. Devem ser umas almas
atormentadas (não se lhes lê um sorriso). Por dentro das suas cabeças, o
“espírito de abril” reconstituiu-se em assombração. Devemos-lhes a liberdade?
Nem quero pensar o que seria da
liberdade se não tivessem, na altura certa, sido devolvidos aos quartéis.
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