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Bonequinha de porcelana.
Pechisbeque para enfeitar. Única serventia. Passeava-se, donairosa e
irrelevante, continuamente calada, ou apenas com soltura de língua para os
comentários banais sobre as coisas banais (afinal, a conversa toda da entourage), ao lado do lobo empertigado.
A altivez era toda dele, o glamour
desprendia-se da asa frívola que ela, autêntico objeto decorativo, emprestava à
função.
O que importava era
mostrarem-se. Era a ânsia social, como se os olhos comestíveis fossem cicerones
da aceitação. A aspiração social, ó tremenda ilusão dos néscios, ocupava o
pensamento diminuído desde o levantar até ao deitar. Coitado, embalado pela
vertigem da fama, pelas fotos nas revistas que fermentam o arrivismo,
deitava-se convencido das proezas. Era conhecida alguma empreitada que não
fossem manobras de bastidores, redes de contactos, favorecimentos que se
alimentam numa espiral sem fim? Não. Às vezes, em médicos ou em repartições
públicas, perguntavam-lhe a profissão. Das primeiras vezes ainda vacilou antes
de oferecer resposta. Agora já estava treinado: “relações públicas”. “Por conta
própria”.
A bonequinha de cristal,
possuída pelo mesmo dote de arrivismo, era ingrediente do estratagema.
Descartável. Logo que aparecesse outra cabeça oca com meio palminho de cara
ansiosa por ser conhecida no métier.
Um dia, numa vernissage qualquer por
onde se passeavam os importantes todos e os que o aspiravam a ser, um empregado
de mesa notou a indiferença com que o pechisbeque era mostrado à audiência. Ela
brilhava, tinha uma aura diferente. Seria dos cabelos aloirados, longos e
curvilíneos, da alvura da pele que contrastava com o carmim deitado sobre os
carnudos lábios. Ou dos olhos, verdes e enormes, que hipnotizavam quem neles se
detinha.
O patego, envaidecido, julgava
que era o chamariz de tanta gente. Metia conversa, à boleia da graciosa mulher
que não lhe largava o braço a tiracolo. Eram objetos decorativos um do outro.
Os demais, embebidos na estultícia conhecida, serviam-se de fermento aos mais
ou menos espalhafatosos objetos decorativos espalhados pela sala. Eram, todos,
objetos decorativos.
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