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A lua nunca era cheia, nem sequer nova.
Amarelecida, projetava a luz timorata sobre a balsa que errava ao sabor dos
ventos que soprassem. Lá dentro, os renegados todos. Sem linhagem, talvez
sociopatas, tresandando a asco, isolados por se não reverem nos cânones que
faziam lei à conduta dos homens.
Não se importavam. A ilha flutuante que
os acolhia era um refúgio dos lugares que eles tinham renegado. A páginas
tantas, discutia-se, desde o cais onde os lentes tomavam função, se tinham sido
renegados contra a sua vontade ou se o estatuto partira deles. Ninguém lhes
perguntou o que achavam sobre o assunto. Quem o fizesse arriscava resposta
torta. Ou não aceitavam que, desinteressados, dissessem os renegados que eles é
que cavalgaram a sua própria exclusão.
A balsa rodava pelos mares. Tinha
propensão para se fazer contra as marés, pois a dissidência era higiénica. A
lua a contrapeso, o sol com pergaminhos baços, as nuvens que nunca eram brancas.
E as águas do mar por onde a balsa sulcava faziam-se lamacentas mal sentiam o
casco enferrujado. Os renegados nem se falavam: cada um era uma ilha dentro de
si. Conviviam em paz podre. Estavam condenados a serem voluntariamente reclusos
do isolamento a que se entregavam. Em não sendo possível haver uma ilha para
cada um, juntaram-se num antro que só o não era para eles. Para os demais,
aqueles que circulavam na normalidade e repudiavam a renegada condição dos
renegados, contavam-se histórias amaldiçoadas para os petizes tomarem
consciência dos caminhos por onde eram aceitados os do bom rebanho.
A balsa dos renegados nunca ia a terra.
Os mantimentos aportavam através de pequenos mercadores que não temiam as fuças
enfurecidas dos renegados. Tinham um pacto com os renegados. De volta ao cais,
os mercadores não diziam palavra. Era o pacto de silêncio que mantinha o
estertor dos renegados. Deixava-os longe da curiosidade dos habitantes
salutares. E selava a sua sociopatia irremediável. Naquela balsa cada renegado dançava
para o seu lado. E nunca era valsa o que na balsa dos renegados se dançava.
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