Tame Impala, “Lost in Yesterday”, in https://www.youtube.com/watch?v=utCjuKDXQsE
As palavras dançam no parapeito do indizível. Procuram-se outros sentidos entre a polimorfia dos sinónimos. Considera-se a necessidade de arejar o vocabulário. Até a sintaxe, por estar refém das convenções. Como se pudesse ser a caução de uma reinvenção da gramática e de seus poros extrair um qualquer sortilégio.
Diga-se: “quer dizer” ou “isto é”, como prólogo do enxugamento da fala. As palavras não devem ficar seladas na sua original formulação. Devem ser mudadas, uma e outra vez, as vezes que forem precisas. Até já não se sentir a pulsão de dizer “isto é” ou “quer dizer”. Seriam as palavras definitivas. Não ficariam devedoras da perenidade. Não, que ninguém se convença do axioma. As palavras só são definitivas quando a elas não se volta. Ninguém pode atestar que não volta a umas palavras emolduradas no tempo pretérito. Essa é uma perenidade efémera.
Às vezes, as palavras que saem do estreito dos dedos não quadram com o pensamento que lhes deu origem. Não ficam representativas. Perde-se algo, no hiato entre o pensamento de que fermentam as palavras e a sua consagração. Podem-se reescrever. Pode-se tentar, ao menos, para que sejam uma correspondência confiável com o pensamento que lhes deu origem. Nessa altura, já não se pode certificar se o pensamento que serve de âncora às palavras reinventadas é o pensamento original. O tempo que passou pode ter adulterado o pensamento e o seu tutor pode não ter consciência da adulteração. É inútil toda a definitividade das palavras. Como é inviável determinar a perenidade do pensamento.
Que seja dito, as vezes que for preciso, “isto é”. Não funciona como uma exegese que parte do tutor das palavras. Funciona como o lastro que se empresta à riqueza semântica. Uma crisálida que se abre às imensas possibilidades de recriação das palavras que foram ditas. Um processo colaborativo, uma parceria em que as palavras são oferecidas aos destinatários e admite que sejam por eles reinventadas.
Nessa altura, serão eles a proclamar, como ponto de partida: “c’est à dire”. E o processo vai por aí fora. Sem direitos de autor.
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