3.2.20

Roubarás descaradamente o título do livro de Walter Benjamin


Ty Segall and the Muggers, “Emotional Mugger/Leoperd Priestess” (live on KEXP), in https://www.youtube.com/watch?v=tUKwrxt27JA
(Escrito em dia londrino, em antítese do dia primaveril por antecipação)
Parece que o nevoeiro está para durar. Tenho as ideias baças, a combinar com o dia. Não sei se levanto voo por cima do nevoeiro, como se fosse um avião, para alardear ter visto o sol num dia em que ninguém o conseguiu ver (como fazem os pilotos de aviões). E qual é a serventia de ver o sol? Garante o desembaciamento das ideias?
A interrogação que se segue: e por que hei de querer as ideias desprovidas de impurezas? Diriam, em resposta fluída: a quem interessa o caos a contaminar as vias internas por onde circulam as ideias? Talvez se olharmos para a História, saberemos da pedra angular onde se firmam as coisas válidas. Não será espúrio o esforço para tornar límpidas as entrelinhas que emprestam morada às palavras. Entre a noite e o dia, compõe-se um vasto mar à espera de voz. Da voz que se arremata no horizonte que desfaz os vestígios de impureza, até ficar uma tela onde sobressai um azul que fere a vista. 
Mas é preciso uma folha de papel imaculada para ajudar o pensamento a vingar? Dizem que se soubermos ser hermeneutas da História, temos em nós cabimento para a experiência. Será então menor a probabilidade do engano, menores os sinais contraditórios que colocam no meio de uma encruzilhada. Os amarelos ramificam uns com os outros. Se alguém convencionou que o amarelo é uma cor proscrita, que venham outros meirinhos das modas desmenti-lo na moda seguinte. Não é a leitura do sal cristalizado nas rochas abertas pela maré-baixa que serve de oráculo. O sal assim deposto é a vingança sobre a maré cheia que quis invadir o espaço vital que já não pertence ao mar. E por que quero saber a delimitação precisa entre a areia e o mar, se me posso servir da tabela das marés?
Cuidam os seguidores do estio apalavrado de emprestar as suas orações ao funeral do inverno, cuidando de o encomendar aos anjos a jeito. Comparam outras tabelas, as que desenham os números que tingem as estações do ano com estatísticas diversas. Querem saber, pela amostra da História, se a teoria do aquecimento global se pode jogar a seu favor, eles que estão tão cansados do inverno e o inverno ainda mal passou o primeiro terço da sua residência. Invocam um “Anjo da História” que possa vir em seu socorro.
Continuo a preferir os rigores do inverno. Não preciso de anjos da História. Tenho uma vaga lembrança de como ela foi. E isso basta-me.

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