20.7.07

Vacas poluentes


Um desafio aos sacerdotes do ambientalismo: insurjam-se contra a praga noticiada há dias no Reino Unido. Não é uma praga de gafanhotos, que logo haveria de se achar uma sinistra teoria que culparia o capitalismo pela migração inesperada dos insectos. Foi o meu amigo J. que enviou um e-mail dando conta da descoberta: as vacas e as ovelhas são responsáveis pela emissão de gases poluentes para a atmosfera, justamente através dos gases que compõem a sua actividade flatulenta.

Há pormenores deliciosos no achado científico (traduzo da notícia estampada no Times online): “as emissões de metano originadas pela flatulência de bovinos e ovinos têm causado tanta preocupação ao governo que a comunidade científica foi encarregada de estudar meios que permitam diminuir essas descargas poluentes, que representam cerca de um quarto do total do metano – um gás vinte vezes mais poderoso que o monóxido de carbono na alimentação do efeito de estufa – libertado para a atmosfera no Reino Unido. Todos os dias, os dez milhões de bovinos britânicos libertam entre cem e duzentos litros de metano. O equivalente a 4.000 gramas de monóxido de carbono, nada que se compare com os 3,149 gramas emitidos por um Land Rover Freelander se viajar em média trinta e três milhas por dia”.

Isto dá que pensar. Dá pano para mangas de reflexão. Começo pelo enviesamento dos ambientalistas. Nunca se lhes ouviu uma palavra, nem se lhes viu manifestação ruidosa, atacando o teor poluente do gado bovino e ovino. Agora que alguém tocou na ferida incómoda para os interesses dos protectores do meio ambiente, das duas uma: ou eles deixam de assobiar para o lado, caindo em si e fazendo de conta que andavam distraídos com a poluição gerada pelo gado, despertando para o combate dos efeitos nefastos da existência de vacas e ovelhas; ou perseguem a senda do radicalismo misturado com a criatividade que desvela teorias da conspiração, atalhando dose significativa de falta de rigor científico, para concluírem que a denúncia da poluição animal foi uma invenção da indústria automóvel para desviar as atenções das acusações que a cercam.

Porventura haverá alguns adeptos do ambientalismo que não estão desatentos. Recordo-me de ter ouvido, no programinha de educação ambiental que a RTP passava antes do noticiário da oito da noite, uma mensagem curta mas subliminar: diminuir o consumo de carne vermelha ajuda a proteger o meio ambiente. Não eram dadas explicações. O que não é surpresa, atendendo à usual falta de rigor científico dos sacerdotes do ambiente, à forma como passam as suas verdades retumbantes – tão retumbantes que dispensam justificações (aliás, se curassem de fornecer explicações, as verdades decerto deixariam de ser assim tão retumbantes…). Agora que sei que a flatulência bovina e ovina deteriora tanto a qualidade do ar (e não é só pelo odor nas imediações), percebo a mensagem. Se comermos menos carne, menor será a criação de gado, menor o impacto ambiental causado pela libertação de metano.

Há soluções finais para problemas tão agudos. Teço um paralelismo com a fobia dos ambientalistas contra o automóvel. Desdobrando-se em iniciativas que sensibilizam as pessoas a prescindirem da utilização do automóvel, argumentando que o automóvel é um dos maiores focos de poluição atmosférica, só restará aos ambientalistas proporem a proibição da criação de gado. Perfila-se uma opção radical e uma opção gradual. A primeira atalha o mal pela raiz: os governos ter-se-iam que pôr de acordo para matar todas as cabeças de gado bovino e ovino, uma espécie de genocídio animal. A segunda opção consistiria num plano para a eliminação gradual das reses, passando pela esterilização e progressiva liquidação de vacas e ovelhas. Os vegetarianos teriam motivo para cantar gloriosa vitória. Mas seria admitida uma excepção, motivada pela idiossincrasia dos indianos que não haveriam de abdicar do estatuto de sacralização da vaca.

Dos males emergem grandes soluções. E da mesma forma que houve quem tivesse descoberto utilização alternativa para o milho, que será a prazo mais matéria-prima de combustíveis (o biofuel) em vez de fonte de alimentação humana, haverá quem descubra solução para aproveitar o metano que o aparelho digestivo das vacas e das ovelhas liberta com tanta prodigalidade. A solução preferida para os amigos do ambiente que são ao mesmo tempo amigos dos animais: inventar-se-ia um mecanismo de recolha dos gases das reses, evitando que se perdessem na atmosfera. E como estes gases são inflamáveis, o seu envasamento seria canalizado para a produção de energia.

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