28.6.04

Águas agitadas

Tenho que dar a mão à palmatória: o Euro 2004 é um sucesso. No passado fui céptico em relação ao evento. Temi que levasse a uma enxurrada de gastos megalómanos, sem retorno visível no longo prazo. Que fosse mais uma sucessão de obras públicas sumptuosas, sem apetência para inscrever o país na rota de um desenvolvimento que rivalize com os parceiros europeus que estão léguas à nossa frente. Mais uma obra para adensar os privilégios absurdos do meio futebolístico nacional.

Até ao momento, estou rendido ao Euro 2004. Pelo colorido trazido pelos adeptos de diferentes países, pelos relatos de adeptos apaixonados pelo país, pelo frenesim favorável à economia nacional. Indicadores que deixam boas expectativas para o futuro. Sugere-se que mais turistas virão a Portugal com o chamariz de quem cá esteve e leva uma boa imagem do lado bom do país. E que mais gente estrangeira, em final de vida activa, fará de Portugal o abrigo para as suas reformas depois de terem provado as delícias que o prazenteiro país tem oferecido. Para culminar em beleza, o Euro 2004 até terá sido responsável por um português ser o próximo inquilino da presidência da Comissão Europeia…

Enquanto grande parte do país anda entretido com o futebol, outra parte, talvez já com saudades de uma boa arenga política, tem soprado ventos tempestuosos a propósito da nomeação de Durão Barroso como presidente da Comissão Europeia. Andamos agora atarefados a escavar o terreno da especulação. Uns com o orgulho inflamado pela honra de ter um português a presidir aos destinos da Comissão. Outros já direccionam a sua atenção para o day after.

Discute-se se Sampaio deve convocar eleições antecipadas. Desdobram-se as opiniões acerca do sucessor de Durão, caso o presidente da república aposte na estabilidade política e não convoque eleições antecipadas. Incoerências vêm ao de cima: sobretudo entre aqueles que defendiam António Vitorino como candidato à presidência da Comissão, como se de um “imperativo nacional” se tratasse, num bolorento patriotismo que soava a mero oportunismo político. Os mesmos que agora criticam Durão por ter aceite o cargo que, na sua maneira de ver, estava fadado para Vitorino. Mistérios insondáveis da politiquice nacional, ou nem por isso…

Não vejo onde Portugal possa ganhar com Durão Barroso como presidente da Comissão. Durão vai assumir o cargo fazendo juras solenes de independência política. Não pode receber instruções de nenhum Estado membro (o que é muito relativo: pode ser sempre instrumentalizado pelas pressões de países dotados de muita força), nem pode actuar em favor de certos interesses nacionais. É ainda menos crível que Durão vá para Bruxelas para defender interesses nacionais. Se o fizesse não chegava a aquecer o lugar. Aliás, como representante de um país pequeno, será mais fácil instrumentalizar Durão enquanto presidente da Comissão. Adivinho que os seus tempos vindouros não serão dóceis. Ficará exposto a um fogo cruzado de influências contrárias. A sua margem de manobra será escassa, andando sempre na mira dos Estados membros mais poderosos. Se tudo isto apenas enobrece o país de onde vem Durão, apetece dizer que é daqueles rebuçados que se degustam sem saberem a nada: fogo-fátuo efémero, glória vã que requenta o orgulho nacional sem trazer benefícios palpáveis.

Nota final para o vendaval político que se instalou em Portugal. Compreende-se que todas as esquerdas queiram eleições antecipadas. Estão a fazer o seu papel, agarrando-se ao oportunismo que caracteriza todas as formações políticas. Se os papéis se invertessem, o PSD e o CDS-PP também viriam a terreiro exigir eleições antecipadas. É para além do oportunismo político que se deve analisar o caso. Os defensores da antecipação de eleições argumentam com a ilegitimidade política de quem vier a suceder a Durão à frente do governo. Reclamam que os eleitores não votaram em Santana Lopes ou noutro qualquer que vier a ser designado como novo primeiro-ministro.

Estes sectores esquecem-se que há um regime político que é mais forte do que as suas vontades secretas. Nas eleições para a assembleia da república os cidadãos votam em listas que representam os candidatos dos partidos. Não votam em candidatos a primeiros-ministros. Se a legislatura tem uma duração de quatro anos, há mecanismos previstos para a levar até ao final caso suceda algo com um primeiro-ministro que o leve a renunciar ou a abdicar o cargo. Sugerem os partidários de eleições antecipadas que a legitimidade política pesa mais do que os preceitos da Constituição. Pasmo com tal teoria – ela própria manifestação do oportunismo político, do desespero de quem vê nesta oportunidade uma janela de ouro para regressar ao poder mais cedo do que previsto (ou, se calhar, a única hipótese de alguma vez chagar ao cadeirão de primeiro-ministro…). Se esta tese tivesse vencimento, fazia-se tábua rasa das normas da Constituição em nome de juízos ao sabor do momento, em nome de uma pretensa “legitimidade política” carregada de subjectivismo.

Que haja muita gente desgostosa com o cenário que se adivinha – Santana Lopes a primeiro-ministro – é de compreender. Para mim é uma hipótese repugnante, a de ver este senhor gerir os destinos de Portugal durante dois anos. Mas é lamentável que considerações pessoais se sobreponham à imparcialidade, à objectividade com que a situação deve ser analisada. Alguns críticos já protestaram com o argumento de que os votantes do PSD depositaram o seu voto no pressuposto de que o primeiro-ministro seria Durão, não Santana Lopes. Mas deviam saber que Santana Lopes era vice-presidente do PSD, logo se perfilava como substituto natural caso Durão renunciasse ao cargo.

Se querem penalizar o PSD pela escolha errada de Santana Lopes, devem esperar mais dois anos, que a legislatura vá até ao fim. Devem esperar pelas políticas de Santana, devem deixar fluir os dois anos de governação mediática e glamourosa, o neón brilhar, o país afundar-se um pouco mais no populismo acéfalo de quem se anuncia como novo primeiro-ministro. Então será o momento do verdadeiro julgamento. Não agora, por um motivo que não ouvi ser aduzido por ninguém: é politicamente legítimo passar por cima da vontade dos eleitores que votaram nos partidos da coligação governamental e que, em teoria, desejam que a legislatura se esgote até ao final? Fazer a vontade à minoria, sacrificando a vontade da maioria, está de acordo com os cânones da ética democrática?

3 comentários:

Anónimo disse...

definitavamente precisas de banhos.As tuas ultimas crónicas têm partido de pressupostos errados,narcisistas e com uma atitude que me tem desiludido.Tens de deixar de te alimentar à base de yogurtes.
o mundo existe para além de ti e a verdade poderá não estar contigo.
Pensa nisso e descansa
um novo mundo vem aí.
a realidade como tu a ´vês tem os dias contados.

sou o Carter

Anónimo disse...

definitavamente precisas de banhos.As tuas ultimas crónicas têm partido de pressupostos errados,narcisistas e com uma atitude que me tem desiludido.Tens de deixar de te alimentar à base de yogurtes.
o mundo existe para além de ti e a verdade poderá não estar contigo.
Pensa nisso e descansa
um novo mundo vem aí.
a realidade como tu a ´vês tem os dias contados.

sou o Carter

Anónimo disse...

Este teu comentário a propósito do Euro deixa-me preocupado. Será que estás cansado e a precisar de ir a banhos rapidamente, ou começo a perceber das tuas palavras uma atitude positiva/construtiva face a algo?
Deve ser a segunda!
A tua filha que aí vem, vai gostar de um pai assim!
Ponte Vasco da Gama
P.S. - Bons banhos!