24.6.04

O Bloco de Esquerda e os neonazis reunidos em Portugal

No último fim-de-semana houve uma reunião de neonazis em Portugal. Os skinheads de toda a Europa fizeram as malas e vieram gozar do sol lusitano enquanto gizavam estratégias em nome dos seus ideais totalitários. Ao mesmo tempo o Bloco da Esquerda, essa colectividade política que é um notável guardião das liberdades, verdadeiro tutelar da democracia parlamentar representativa, exibiu o seu protesto pelo pseudo-congresso dos skinheads europeus.

Não me interessa discutir as ideias dos neonazis – o racismo, a xenofobia, o cercear das liberdades individuais. Apenas manifesto aqui a total repulsa pelo que elas representam agora e no passado. Diferente é a postura de quem convive mal com a tolerância, valor essencial para o reconhecimento das liberdades individuais. O que questiono é se a defesa dos valores de tolerância, da integração de quem pensa diferente de mim, se compadece com atitudes que tentam vedar o acesso à arena política daquelas formações que não respeitam estes mesmos valores. Seremos democráticos e inclusivos se rejeitamos a participação dos que não se revêem nos valores que alicerçam o sistema? Não estaremos, pelo contrário, a jogar o mesmo jogo de quem é anti-democrático ao impedir que eles tenham acesso à antena?

Estas interrogações vêm a propósito de mais um acto solene do Bloco de Esquerda, que se pôs em bicos de pés para vincar o protagonismo que se lhe reconhece desde que conquistou “respeitabilidade política” (desde que passou a ter representação parlamentar). Só o Bloco de Esquerda deu conta da peregrinação turística dos neonazis europeus, protestando contra o conclave desta gente de extrema-direita. Dirigiu uma petição ao presidente da assembleia da república manifestando o seu desagrado. Veio para os jornais numa campanha ruidosa, desgostoso por Portugal dar coutada a tantos energúmenos que são uma ameaça à liberdade. Se o Bloco de Esquerda mandasse os neonazis não passariam da fronteira.

Fico admirado por se dar tanta atenção aos protestos do Bloco de Esquerda, quando esta espécie de coligação agrupa partidos que não são conhecidos por respeitarem os valores da liberdade individual, por ainda professarem valores como a ditadura do proletariado, por não se terem desprendido da figura tutelar de Trotsky. Basta dar um passeio pelos sites do PSR e da UDP para verificar que estes objectivos programáticos constam, intactos e actuais, dos respectivos programas de acção.

É por isto que me pergunto que legitimidade tem o Bloco de Esquerda para se insurgir contra a reunião de neonazis em Portugal. Porque os neonazis são uma ameaça à democracia? Serão mesmo? Por acaso os serviços secretos de toda a Europa convergiram a Portugal perante a “séria ameaça” de um golpe de Estado que varresse do mapa a tão querida democracia? E, já agora, não representa o Bloco de Esquerda (pelos valores políticos que ainda não foram renegados) uma ameaça idêntica ao valor da tolerância, às regras do jogo democrático? Os métodos serão diferentes da extrema-direita. Sabe-se que a extrema-esquerda onde se acoita o Bloco de Esquerda não tem o passado tão manchado de sangue como a extrema-direita. Mas os objectivos finais serão assim tão diferentes quando se compara a extrema-direita com esta extrema-esquerda?

O respeito escrupuloso pelo valor da tolerância não se compadece com decisões arbitrárias que impedem as franjas totalitárias de exprimirem as suas opiniões. É esta a verdadeira diferença entre quem se afirma tributário do valor da tolerância e aqueles que o menosprezam. Os primeiros sabem dar o flanco para que os segundos combatam o sistema por dentro. A decisão final cabe a quem vai votar: se preferem ter o direito de continuar a votar, ou se preferem, com o voto nas formações totalitárias, deixar de votar no futuro.

Negar a existência de partidos totalitários é a negação da democracia. Seria como corroer a democracia por dentro, aniquilando a liberdade de expressão a que os opositores do regime democrático têm direito. Os que se ergueram contra a presença dos neonazis deram a melhor imagem de como são a antítese da tolerância democrática, de como eles mesmos constituem um perigo para a democracia.

2 comentários:

Anónimo disse...

O meu comentário não está relacionado com o tema do dia, mas apenas com uma frase que lá colocaste: "A decisão final cabe a quem vai votar: se preferem ter o direito de continuar a votar, ou se preferem, com o voto nas formações totalitárias, deixar de votar no futuro"
O que significa, neste contexto, a abstenção?
Deixar aos outros a responsabilidade de poder votar no futuro?
Um abstencionista arrisca-se, um dia, a querer votar (exprimir o seu voto) e a já não o poder fazer porque os outros decidiram entregar o poder a um partido totalitário.
No fundo, mais do que exercer o direito de não ir votar, o abstencionista está, na prática, a fazer o mesmo papel dos povos dos países totalitários. Não vota.
Um por opção, os outros pela força. Mas ao fazê-lo por opção, arrisca-se a perder essa mesma opção - e a não poder "reclamar".
Ponte Vasco da Gama

Anónimo disse...

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