O novo estatuto autonómico da Catalunha, acordado entre as autoridades de Madrid e as autoridades regionais de Barcelona, tem levantado polémica. Os que temem pela desagregação da Espanha sentem no ar uma ameaça. Suspeitam que o novo estatuto liberta o garrote que tem aprisionado as asas da independência catalã. Do outro lado, o descontentamento dos que se sentem subjugados a uma soberania alienígena: a autonomia será reforçada em relação ao que existia antes, mas ainda longe do objectivo final, a total independência da Catalunha.
Há anos passei férias na Catalunha. Conheci terras, convivi com as gentes catalãs. Percebi que há uma afinidade muito grande entre os catalães e quem vem do norte de Portugal. Talvez por erro de análise deles, julgando que no norte sofremos do mesmo asfixiamento centralista que impede a Catalunha de ser um país soberano. Discerni uma desconfiança congénita em relação a Madrid, por vezes um ódio latente. Se bastasse uma língua diferente, uma história distinta, costumes que diferenciam uma região de quem nesse local exerce dominação, a Catalunha reunia as condições para ser um país independente.
Tento fazer a ponte entre a Catalunha e o norte de Portugal. Por diversas vezes escutei palavras de conforto dos meus interlocutores catalães. Olham para os nativos do norte de Portugal à sua imagem, aprisionados no jugo de um país que teima em manter a unidade de um todo que, como todo, é um produto artificial. Por cá é tema que não faz correr tinta. Medem-se regionalismos exacerbados, no norte como na Madeira. Declarações que soam a patético, na exteriorização de um regionalismo bacoco, quantas vezes confundido com a inveja por não ser o norte o protagonista.
Não há tensões nacionalistas, apenas assomos de regionalismo inconsequente, insatisfação pelo “complexo do Terreiro do Paço”. Nem os mais fanáticos regionalistas defendem o desamparcelamento com o resto de Portugal. Por aqui, apenas regionalismo, não o nacionalismo que se sente latejar nas veias de tantos catalães. Só um fermento de rivalidade de gente que, no limiar, partilha uma identidade. Rivalidades, invejas, ressentimentos de uma região que, rezam as crónicas, tanta riqueza produz e pouco é reconhecida na sua importância. Ressentimentos de pessoas quando a acentuada pronúncia nortenha é vilipendiada por sulistas ensimesmados. Nada de importante. Nem comparável aos atritos reprimidos entre catalães e madrilenos centralistas.
Não é a norte que passa o discurso da auto-determinação. Nem nos mais patéticos militantes de um “nortismo” inconsequente. Porque há diferença entre ser nortenho e ser nortista. Nortenho sou, nascido no Porto, quase sempre aqui a viver. Com orgulho na minha cidade, com tantas palavras elogiosas para paisagens e gentes espalhadas pelo norte, das verdes extensões que alindam o Minho até às gentes acolhedoras de Trás-os-Montes. Recuso-me conceber o Porto natal como bandeira de uma grande região que se demarca pela geografia. Que sentido faz lutar contra o “complexo do Terreiro do Paço” e depois arrepiar caminho a mais um Terreiro do Paço, a norte, algures na Avenida dos Aliados?
Há fenómenos que o tempo se encarrega de trazer para a contemporaneidade que são a imagem de um colete-de-forças, emparedando tendências contrárias. A globalização, com a sua força indomável, parece esvaziar os países, empurrando-os para organizações onde se agrupam para combater os ventos da globalização. Ao mesmo tempo, nacionalismos reprimidos pelos descaminhos da história, remetendo comunidades minoritárias para um papel subserviente dentro de um país que funciona, para essas comunidades, como um invasor, um corpo estranho. De um lado, a união de países em organizações, como se a cooperação entre os países domesticasse a globalização. Do outro lado, pressões para a pulverização dos países, pelo reconhecimento de nacionalismos que gritam bem alto os desejos de auto-determinação e independência.
Quando estive na Catalunha, recordo-me de um anfitrião, durante um jantar, ter protestado contra a hispanidade. “A Espanha é um mosaico de nacionalidades. Uma artificialidade”, asseverou. Disse-o com a esperança de um dia poder descansar no túmulo, coberto com a bandeira da Catalunha, da sua Catalunha já arvorada em nação independente. Não adivinho, aqui pelo norte, ambições tão ousadas, neste território tão homogéneo, tão estanque a desvios regionais (para além dos ditirâmbicos devaneios de alguns madeirenses). É a diferença entre um nacionalismo sedimentado na história, na cultura, numa língua; e um regionalismo que nasceu de um erro histórico, a centralização que deu mote ao aforismo “fora de Lisboa, a província”.
Um provincianismo alimentou outro provincianismo de sinal contrário – os cultores do centralismo do Terreiro do Paço e os invejosos nortistas que querem uma talhada do poder lisboeta, quantas vezes por simples despeito.
2 comentários:
A Catalunha já foi um estado independente, aliás, para além de Portugal eno espaço da Península, foi o único que bateu o pé ao centralismo de Castela-Leão. Quem disse que a Espanha é uma artificialidade disse-o muito bem. Espanha mais não é que um sistema de "cheks and balance" geopolítico, que reúne sob uma mesma ideia de nação varios estados distintos entre si. A Catalunha é - tal como Norte de Portugal hoje - o "motor" da economia espanhola e faz valer essa condição para se impôr num contexto de autonomia cada vez maior. Mas parece inverosimel que volte a ser independente; o poderio da noção de Espanha que Franco - que tanto atacou a Catalunha republicana aquando da Guerra Civil - criou e fez continuar depois sob a bandeira da Monarquia Constitucional é altamente asfixiante para a emergência dos nacionalismos insertos no território espanhol. Catalunha, Galiza e o caso mais flagrante do País Basco são provas inequívocas do atrás dito. Percebe-se até historicamente o imenso respeito que Portugal e os Portugueses têm junto dos Catalães, Bascos e Galegos. Tal não será por acaso ou simplsmente mera simpatia, antes respeito e admiração pelo único povo peninsular que logrou a independência.
Mas afinal o que é isso do norte?
Isso é uma invenção do Pinto da Costa, e tem 25 anos.
O norte do pinto da costa não passa de gondomar ou de ermesinde.
Esse norte a existir não passa da área metropolitana do porto, percebem?
Os Transmontanos, de Trás-os-montes não fazem parte deste norte, e falo como Transmontano.
Trás-os-Montes, não é norte!
Norte é Porto e área metropolitana, na melhor das hipóteses distrito.
Esse norte do pinto da costa acaba em Gondomar ou Valongo, na melhor das hipóteses distrito do Porto.
Certo!
Uma coisa é o norte geográfico do pais, outra coisa é este norte politizado em torno do FCP e do pinto da costa, percebem?
A identidade Transmontana tem 600 anos, a província de Trás-os-Montes foi criada no sec XIV, por D. Dinis, e o pessoal lá diz-se Transmontano e não do norte.
No fundo isso do norte e sul resume-se a Porto e Lisboa e mais nada.
Não misturem o resto do pais nisto!
Para termo de comparação, o que se aplica aos Transmontanos e Minhotos aplica-se aos Alentejanos e Algarvios.
O Alentejo e o Algarve fazem parte do sul geográfico do pais, mas eles não se definem sulistas, definem-se Alentejanos e Algarvios.
O mesmo se aplica aos Trasmontanos e aos minhotos, estão no norte geográfico do pais, mas definem-se Transmontanos e Minhotos.
Percebeu agora?
E o pessoal de Lisboa é como um cepo, entre nesta psicose do norte para aqui e para ali.
E não vê que com isto só está a dar poder ao Pinto da costa, involuntariamente estão a meter os Transmontanos no mesmo saco dos Portistas, e os Transmontanos não querem isso, nem se identificam com isso, e no Minho igual.
Não se refiram ao norte, não usem essa expressão, digam Porto.
Depois esta comparação do Porto com a Catalunha, é no minimo aberrante e apenas pode vir de um acéfalo que nada perceeb de história de portugal, e que se esqueçe que portugal nasceu precisamente nesta zona do pais.
Cure-se.
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