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(A semanal irritação aos comunas do burgo)
Há fenómenos que se repetem com a distância das décadas, à distância da geografia, com personagens que aparentemente estão nos antípodas. Nos idos de sessenta, um ditador caiu da cadeira e continuava convencido que mantinha as capacidades mentais para ser o presidente do conselho de ministros. Mais de quarenta anos depois, outro ditador, de outra estirpe, deve estar convencido que continua a mandar lá na terra dele depois de ter vencido uma terrível doença.
O camarada Fidel continua a lutar contra os moinhos de vento de sempre. É o medonho capitalismo que oprime os desfavorecidos, essa imensa e silenciosa maioria que devia fazer um levantamento e instituir o profiláctico comunismo em todo os lados. São os Estados Unidos, inimigo de estimação, fonte de todos os males que acontecem ao mundo. E são os dissidentes, esses traidores que, para além da ignorância (como podem desdenhar das maravilhas do comunismo, esse paraíso de liberdades e de bem-estar individual), conspiram desde Miami para que Cuba se liberte da mantilha libertadora do comunismo e regresse à escuridão do passado.
Depois da doença, o camarada Fidel recupera. Já não apresenta o ar macilento. Consta que está na posse das suas faculdades mentais, pois a propaganda do regime trata de maquilhar a existência de um herói a quem pouco falta para ser imortal. Entre conselhos ao irmão que lhe sucedeu à frente do partido e, por inerência, do país – o que parece trazer a sucessão dinástica das monarquias para o comunismo – o camarada Fidel tem tempo e energia para receber o tiranete da Venezuela numa reunião de cinco horas, cinco. E para descobrir a pólvora: anunciou que o terrorista mais procurado do mundo, o barbudo (como ele) Bin Laden, é um agente da CIA.
As reminiscências do passado transitam na sublime comparação dos episódios. Um ditador caiu da cadeira e nunca mais foi o mesmo, apesar de estar convencido, no seu íntimo adoentado, que continuava a ser o chefe da banda. O ditador de Cuba deixou de estar acamado na terrível doença – que nem a terrível doença consegue consumir aquela carcaça – mas dela saldou-se com uma senilidade atroz. A menos que todas as teorias da conspiração que atribuem os piores desígnios às autoridades dos Estados Unidos tenham correspondência com a realidade.
Já por mais do que uma vez aqui deixei palavras de antipatia pelo papel que os Estados Unidos desempenham no mundo. O que não me coloca à mesa com os apóstolos das conspirações que atribuem a fonte de todos os males àquele país (como uma sugestiva inscrição numa parede perto de minha casa sobre a autoria dos atentados de 11 de Setembro de 2001: www.demolicoescontroladas.org.) Aos senis devemos dar o devido desconto. Assim como assim, o ditador Fidel habituou-se, desde que vestiu a fardamenta de ditador, a dizer o que bem lhe apetece porque nunca foi confrontado com o contraditório. Habituou-se a que a sua palavra tivesse a força de lei. Ele dizia e estava dito, sem necessidade de provar os disparates que ia oferecendo. Ora, ou apresenta provas irrefutáveis de que Bin Laden anda a soldo da CIA – o que seria um terramoto devastador nos alicerces das relações internacionais – ou o melhor é dedicar-se à pesca ou a outra qualquer actividade lúdica que faça passar devagar os derradeiros anos de vida que o esperam.
Se calhar é do calor tropical que banha a ilha. A ver pelo que se passa aqui, com 37º de máxima para hoje, e o mal que isso me faz ao discernimento das ideias. Com duas diferenças: por cá, esse calor é excepção; e não me perdoam se vier para aqui com afirmações bombásticas sem prova que as sustente.