18.5.11

A conspiração do sexo (segundo acto)


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A andorinha foi alvejada pela escopeta do Arnaldo. Ele tinha ido à pesca e, à cautela, não fosse a pescaria andar esquiva, levou a escopeta para matar o tédio. E a andorinha, a infausta andorinha, que por ali passava no seu voo de hibernação rumo às terras africanas, pumba, pereceu na ponta de mira da fúria do Arnaldo. Que, é bom que seja revelado, andava de candeias às avessas com o mundo inteiro (ou quase).
O Arnaldo era visita recente do desemprego. Ninguém lhe tirava da ideia que houvera conspiração daquele grupo que almoçava todas as quintas-feiras na tasca adornada por azulejos ribatejanos. Os colegas todos aperaltados (na antítese do Arnaldo, sempre de fato e gravata em perene desarranjo das cores e com atracção pelas nódoas depositadas pelas sobras do almoço), faziam gala em ostracizá-lo. Porque, tinham a certeza, o Arnaldo gozava das preferências do conselho de administração. Eles ensaiavam deitar o Arnaldo numa emboscada. Mal sabia o Arnaldo que ali só estava a face visível do insidioso plano. Os pipis apessoados, gente vistosa mas carente de competência que se visse, juntavam-se todos os dias ao almoço, às escondidas, cozinhando a urdidura.
Enfim, lá trataram do arranjinho, com falsificação de assinaturas que comprometeram o Arnaldo. Os chefes andavam espremidos pelos accionistas. Tinham de fazer dieta aos custos. A porta da rua seria a serventia para os excedentários. Um dia, aterrou um repto em cima das secretárias dos gestores em forma de carta-ultimato: ou apresentavam um plano de despedimentos (falava-se em 30% do pessoal), ou quem lambia primeiro a sobremesa do subsídio de desemprego era o conselho de administração. Foi no dia em que apareceram os documentos falsificados que comprometiam o Arnaldo. Ao fim do dia estava com os haveres à porta, com uma mão à frente e outra atrás, que as acusações eram tão devastadoras que não havia lugar a indemnização.
Os accionistas contavam os tostões e vertiam lágrimas pela abreviação dos lucros. Os outros planos, investimentos noutras paragens, o iate, a remessa para o offshore do costume, a sumptuosa jóia prometida à amante, tudo adiado para segundas núpcias. A desditosa crise soava as trombetas do alarme e ninguém delas se escafedia. Um efeito dominó que por aqui começou e só findou na inofensiva andorinha que jamais aportaria no refúgio da invernia europeia.
Coitado do DSK. Há muitos europeus varados com a armadilha que lhe montaram. As possibilidades são para todos os gostos. Há a versão da inveja partidária, a maldita direita que encenou o ardil para matar uma carreira política. Há a versão “foi a América”, que não aprecia que se salve da bancarrota os mal comportados países que entraram em diarreia orçamental. Ou a mesma “América”, que insiste em mostrar imagens humilhantes de DSK algemado a caminho do tribunal, só para apoucar a França, só para nos certificarmos que a grandeza da França teve os seus dias. E, ai, que isso não se faz, que a gente importante devia ser preservada da humilhação que se destina apenas aos zés-ninguéns apanhados no alçapão da justiça. Um correspondente noticioso em Paris chegou à babugem, desdenhando a vítima da violação: que se descubra quem é, denigra-se a senhora, faça-se culpada de tudo isto.
E a responsabilidade pelos actos, não há quem se interrogue por anda ela?

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