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Prospera, a moda. Pelas grandes cidades de Espanha, um grupo numeroso de jovens (e menos jovens, que o romantismo de outrora nunca se perde de vista) tomou conta da praça central. Montaram uma “acampada”. E protestam. Contra o capitalismo, acima de tudo. E contra os seus filhos: as injustiças sociais, a falsa democracia, a falta de oportunidades que espezinha os jovens, o desemprego (massivo, em Espanha), a comida artificial, a ainda ostracização das mulheres, a miséria, a “América”. Acreditam que estão a fazer novas praças Tahrir – como se achassem que isto é o próximo Egipto.
Nos passeios por Granada passei algumas vezes na “acampada”. Detive-me um tempo para a apreciar. Há muita gente de direita que se insurge contra a ocupação selvagem de um espaço público. Sentem-se incomodados por um espaço público ser tomado de assalto por movimentos que entoam pregões que desfazem de cima baixo os ideais destas direitas. Depois usam o argumento da legalidade para repudiarem a ocupação selvagem: comerciantes e feirantes pagam taxas, e elevadas, por tudo e mais alguma coisa. Por que se isentam estes radicais do pagamento de taxas se estão a ocupar de um lugar público? (E adicionam o argumento da inestética, pois aquilo é um caos montado.)
Tenho a impressão que esta direita incomodada (e, por isso, conservadora) está errada. O folclore muda as feições dos lugares que estamos habituados a olhar com a indiferença das rotinas. O mal da direita conservadora é embalar ao sabor da triste melodia da “autoridade do Estado”. Ela gosta de ser açoitada pelo Estado mandão. O argumento da ocupação selvagem de um espaço público é uma falácia. Se o lugar é público, entregue-se a sua serventia ao folclore que reaviva os lugares empenhados na cansativa rotina.
Não fazia mal a esta direita conservadora empregar uns minutos da sua lufa-lufa diária a apreciar a “acampada”. Se desconfiam que vão ser rotulados pelo vestuário (pois: não usam andrajos nem envergam “rastas” no cabelo, não passeiam falta de higiene, não perfumam a atmosfera com o odor da ganza; e se forem senhoras, não são senhoras – são mulheres –, andam descalças em cima das sujas pedras graníticas, ostentam falta de duche e mostram alguma alergia a soutiens e também atiram para a atmosfera o perfume da ganza), estejam descansados. Sempre que lá fui sentia-me um “corpo estranho” na praça. Não me sentei no chão, como a malta que se ajuntou na “assembleia de vozes”. Mas não notei que algum jovem (ou menos jovem) “acampado” olhasse de soslaio com os modos de quem diz “não és bem-vindo”. Não são eles que destilam preconceitos.
Gostei de outra característica destes jovens em libertação das suas utopias: muitos fazem-se acompanhar de cães. Bem nutridos cães, em contraste com as figuras subnutridas dos companheiros humanos que os passeiam pela trela (ia a dizer “donos”, mas recuei a tempo para não ofender as crenças).
Observei idealismo a rodos. Estão convencidos que praticam democracia genuína – quer os que tomavam conta da “assembleia de vozes”, ditando sentenças sem se aperceberem que eram uma chefia; quer os participantes na assembleia, sentados em redor, colaborando, com a sua anuência, com as sentenças. Notei nos olhos embaciados de emoção de uns já não tão jovens que recordavam idealismos de outros tempos. É uma militância colectiva fervorosa (“o todo é superior à soma das partes” – estava escrito num cartaz, as letras garrafais). E renderam-se às delícias do vil metal: nas bancas de comes e bebes e noutros arremedos de estabelecimento comercial lá estava a placa “tesouraria” (onde se paga pelos serviços e produtos).
(Em Granada, Espanha)
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