3.2.12

Em banho-maria


http://whatscookingamerica.net/Foto4/BoilingWater.bmp
Submerso na banheira, longos os minutos de inércia. Tantos que a água estava um espelho chão a abraçar o corpo tépido. O vapor circundante adelgaçava a penumbra que se deitava sobre as pálpebras. Sentiu o torpor que vem do chamamento do sono quando o dilema berra aos sentidos e eles sem saberem se a coreografia de pensamentos é apenas o regaço do sono ou um viveiro de veracidades.
Moveu uma perna, a perna que adornava na dormência. As ondas que se levantaram, descompondo a simetria da espuma, bolçaram a alvorada de sonhos que queriam levitar no vapor viperino. Os outros pensamentos, os que sobram da introspeção que os derradeiros dias adestraram, povoaram o espaço em redor. Tingindo o vapor com as cores dos enigmas que locupletaram o pensamento, acanhando a ação. Tivera dias resolutos; saíra de casa convencido da necessidade da ação. Já sobravam arrependimentos encavalitados nos calendários devolvidos à reciclagem do tempo. Já sobravam as angústias pelos desapiedados atos que custaram tantas lágrimas vertidas, incineradas lágrimas. Mas as resoluções intimidavam-se com as horas que subiam no horizonte. Assim que o sol enchia o céu, a cabeça mergulhava em seus enigmas irresolúveis. Os dias eram um adiamento. As ações, esboços de intenções.
Quisera-se convencer que não era madraço. Não curava de separar as poeiras para encontrar o ouro que seria promessa para um porvir qualquer. Os freios não se intimidavam com as resoluções. Derrotavam-nas. No fim de contas, eram as peias que se perpetuavam. E ainda assim convencera-se que não era traidor de si mesmo. Nunca capitulara, mesmo quando de fora todos os desinteressados observadores não hesitavam ao afiançá-lo de tal desdita. Pacientemente, retorquia que estava embebido no banho-maria que apascenta a lucidez.
E o banho-maria, como se fosse uma hibernação autoimposta, era o tirocínio da madurez. 

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