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Afinal
a propaganda importava. Afinal, os revolucionários já não tinham aversão à
propaganda. Em sua defesa, esgrimiam argumento indestrutível: ao menos esta
propaganda está ao serviço de causas que favorecem o povo. Não podia ser
mentirosa. Mesmo quando mentia: Por vezes, os fins justificam os meios.
Por
aqueles tempos em que mal tinha assentado a poeira da revolução, as chefias e
os pensadores esboçaram uma prioridade: convencer o mundo inteiro, e a começar
os próprios patrícios, que a normalidade tinha aterrado. Não houvera
resistência de quem foi deposto do poder. Os militares logo se alistaram no
imenso exército de gente assoberbada pela indignação contra os fascistas do
capital. Não houve sangue derramado. Nem tiros disparados. As vésperas foram de
violência atroz: pertences incendiados sem critério, lojas saqueadas e depois ateadas
com petróleo incensado, bárbaras agressões aos poucos aduladores do regime em
estertor. Mas isso fora a voz da revolta, gritada a plenos pulmões, a voz
incapaz de aguentar as contínuas aleivosias dos banqueiros, dos capitalistas
que teimavam no consumo ostensivamente ofensivo.
Agora
estava tudo nas baias da normalidade. Os malévolos saqueadores da riqueza do
povo tinham fugido para o estrangeiro. Só alguns foram metidos em cárceres. Era
preciso convencer o mundo inteiro da normalidade. Ou a maré revolucionária não
conseguia aportar noutras terras.
A
propaganda escondia, debaixo do seu véu amotinado, um mar de sangue. Em
tresloucada vingança, os poucos magnatas apanhados antes de zarparem foram
vítimas da barbárie. O povo queria a justiça nas suas mãos, nas praças
públicas. As chefias, tementes do efeito devastador, mandaram calar a populaça.
Em surdina, prometeram que a justiça seria feita como o povo queria. Mas sem os
holofotes da imprensa. Garantiram que os julgamentos seriam exemplares. E eram.
Julgamentos expeditos, sem direito de defesa (a não ser por uns neófitos
advogados sem experiência). Sem direito a apelo para tribunal superior, que o
tribunal popular nascido do nada era o tribunal arvorado em sua majestosa
superioridade. As sentenças eram cruéis. Os magnatas e alguns ministros e
conselheiros descobertos a tempo, liquidados com requintes de malvadez no dia
da sentença.
A
propaganda escondia estes vícios privados dos olhos do mundo inteiro.
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