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Depois
de uma noite mal dormida, os que pensavam ser os mandachuvas do país
intervencionado saborearam um pequeno-almoço requentado e a privação da
liberdade. Não estavam autorizados a sair da cela. Era ainda manhã cedo, um
general mal encarado avisara que a junta revolucionaria ainda não decidira o
que fazer com eles. De uma decisão estavam certos, e tinha sido tomada: estes
presos especiais só tinham uma regalia: uma televisão sintonizada no canal de
notícias internacional, para perceberem o que haveria de ser dito pelo chefe
interino da revolta dentro de um par de horas.
À hora
anunciada, um general promovido, enfiado numa fatiota dois números acima,
apareceu à frente da televisão. Desembrulhou um papel amarrotado, extraído ao
sufoco do bolso junto à lapela. Não conseguia esconder o enervamento. Tossicou
duas vezes, prolongando a ansiedade dos espetadores. A voz começou a sair
trémula:
“Bom povo, esta é a vossa carta de alforria.
Os bastardos agiotas já não nos apoquentam mais. Os cabecilhas do grupo estão
sob detenção. A junta revolucionária decidirá, em harmonia com a vossa vontade,
a punição de que são merecedores.”
Os
negociadores sentiram um aperto na goela. A boca secou-se. Os batimentos
cardíacos acelerados, como se o coração quisesse saltar as peias onde estava
acantonado. Começaram a temer pela sorte. Sabiam, a história recordava-o, nos
tumultos revolucionários a lucidez ausenta-se dos palcos. Temiam pela
selvajaria. Que a turba enfurecida, com sede de vingança, arrombasse as portas
das celas e acertasse as contas da vingança pelas próprias mãos. Os olhos
cansados voltaram a fitar a televisão. O general deslavado continuava a ler o
manifesto, já sem a voz trémula. Aflito, quase na tangência da apoplexia, um
dos negociadores ainda reteve o catecismo que encerrou o manifesto lido pelo
revoltoso:
“Agora dirijo-me aos povos da Europa. Não
capitulem. Os agiotas não nos podem derrotar sob os escombros do capital
parasita. Somos humanos, somos dignos. Aprendam com a nossa lição. Somos outra
vez a vanguarda da civilização. De uma nova civilização. Amotinem-se. E convençam-se
que a Europa é nossa.”
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