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Tão gordas que o úbere era um
inchaço a tocar o chão, as tetas leitosas enrubescidas de tantos lá se saciarem.
A democracia tratou de nos educar para a pedagogia da afluência, que isso de
viver à rédea curta, quase em minimalismo monástico, era vestígio salazarento.
Aprendemos a medir as ambições por uma estaleca que era maior que a estatura
que tínhamos. Depois vieram os bancos patrocinar a abundância: não havia contado,
mas haveria crédito fácil. Era a multiplicação dos sonhos. Tínhamos direito ao
nosso quinhão de consumo, enfim. Foi uma roda viva. Empenhados em satisfazer as
cobiças cerceadas às gerações anteriores, nem tivemos tempo para medir o pulso
ao amanhã. Mas o amanhã teria de vir. O amanhã era uma fatura. Prometida a
estalar na boca, seca e dolorosa, quando o chão da fartura desabasse ao cabo de
uma curva mal desenhada. As vacas emagreceram. Estão carcomidas, as forças
exangues de tanto sorvidas até ao tutano. Já não abastecem leite. Agora andamos
cabisbaixos. Alguns protestam contra as ilusões vendidas, como se a abastança
fosse sinónimo maior de recompensa interior. Bem diziam uns profetas da
desgraça, uns que se atiram ao capitalismo que nem mastins, que andávamos aferrolhados
aos capitalistas que se encheram depois de termos ido no engodo do consumo
mirífico. E agora, que as vacas são magras e macilentas, a tristeza
apoderou-se. Sobra o arrependimento de termos definhado as vacas outrora
gordas. As lojas fecham, as fábricas despejam na inércia uma maré de
desempregados, os olhos embotam-se na irrelevância dos amanhãs sombrios. Uns
médicos tentam panaceias de última hora, para ver se as vacas se extraem ao
pré-coma. Paninhos quentes, apenas. De um canto obscuro, uns esculápios pouco
escutados pressagiam o remédio: fomos enganados quando nos contaram que as
vacas estavam gordas. Elas estavam só inchadas (como o gado de aviário obrigado
a consumir esteroides encomendados para o crescimento precoce). Se calhar, o
precato era o remédio. Ou vai a bem, ao doerá mais se for a mal. Pois hoje as
vacas são magras, e muito.
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