7.4.14

Partir pedra

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Ao primeiro olhar, uma dureza que intimida. Os blocos inertes, mastodônticos, impenetráveis. E nós temos apenas as mãos e umas artes rudimentares. A empreitada parece impossível. Mas ao deitar, quando na véspera do sono repousam as apoquentações sobrantes, celebramos a impossibilidade dos impossíveis.
A alvorada faz-se radiosa. Os pés metem-se ao caminho, sem demora. Os planos amontoam-se na revoada da tempestade cerebral. Não será a empreitada vultuosa que desestima os esforços. As mãos vão às artes e começam a partir pedra. Centímetro a centímetro. Vendo, com o passar das horas, um pequeno espaço nascer onde antes fora império da pétrea rocha acinzentada. E nem as mãos ensanguentadas de tanto as esforçarmos atemorizou a empreitada. O tempo foi passando, com diversos tempos que se faziam, ora solarengos, ora tempestuosos, sem que as mãos se não entregassem às gastas artes que continuavam perfeitas na sua função.
A pedra partida caía pela encosta, dando outra feição à paisagem. As mãos continuavam a partir toda a pedra que continuava a nascer das entranhas. Os planos mentais não recuavam nas intenções. Era preciso arrotear a encosta. Era preciso derrotar o terreno agreste, pois sabíamos que ali havia terra fértil se a pedra que era sua dura epiderme fosse devastada. Os braços não se doíam, mesmo que cada jornada de trabalho fosse da igualha de forçados trabalhos. E nem a pele crestada pelo sol a pino, quando o estio causticava o lugar que já parecia bastardo, ou o corpo enregelado ao cabo de um dia de tempestade, frígido pelo vento e pela chuva severa – nada nos demoveu de cinzelarmos com as nossas mãos uma nova feição ao promontório. Partimos a pedra que foi preciso para sermos arquitetos da paisagem. Domámos a paisagem e então fomos feitores da sua fertilidade.
Demos vida a uma paisagem inerte, agreste, espontânea mas adormecida. Foram os nossos braços que tomaram a paisagem num estirador. E as mãos foram fazedoras de um milagre sem intercessões sobrenaturais.

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