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Um espécime intrigante, os sabe-tudo.
Categóricas afirmações, não se besuntam com pessoais dúvidas. ou, acaso as
tenham, escondem-nas para não darem parte de fraco – não vá a humildade ser um
flanco aberto, o que não cabe na imensa sabedoria.
Discorrem sobre tudo com a mesma
catedrática pose. Ele é cada naco de conhecimento que os que os ouvem ficam
esmagados com tanta sabedoria acumulada. Ou acontece ficarem estarrecidos,
quando a prosápia se enfeita de números à sorte cuspidos ao ar, como quem repousa
em estatísticas que são destiladas com o conhecimento de causa de quem sobre
elas assentou sem vagar. Os sabe-tudo lidam mal com as ideias que são
diferentes. Não é de somenos estranhar: os categóricos imperativos estão bem
entranhados, não há lugar ao ar espairecido de diferentes ideias das suas.
Praticam com peritagem o saber do desdizer quando desse desdizer depende o
enraizar da sua consabida sabedoria. Se preciso for, apoucam quem lhes aparecer
pela frente a destruir as categóricas ideias. À falta de melhor, deitam mão à
diminuição da pessoa que se atreve a praticar a dissidência das suas perfeitas
teorias. Não vão lá com argumentos; fulanizam o adversário, como se as (nas
suas pequeninas cosmovisões) desconsiderações pessoais chegassem para empurrar
o adversário às cordas.
Os outros deixam-nos destilar a
sabedoria que os sabe-tudo julgam enciclopédica. É um ato caridoso. Ou assobiam
para o ar, pois dá-se o caso de as coincidências verterem a tinta do desmentido
em saberes de que os sabe-tudo não são tão peritos como quem os ouve. É um
risco: há audiência por contado, audiência que se conhece e a quem a anedota do
conhecimento enciclopédico é isso mesmo, uma anedota que roça a indulgência;
mas há quem não trave tamanho conhecimento com os sabe-tudo a soldo do
conhecimento de caserna e desfaça em nada uma exibição pomposa de árida
erudição. Mesmo assim, à noite, os sabe-tudo ostentam o narcisismo e contemplam-se
junto ao largo espelho em vésperas de sono, capacitados de que são nobre matéria
para o conhecimento da espécie. Só se for da subespécie em que vegetam, pois
outros sabe-tudo aclamam, com tácito deferimento, o nulo interesse conhecimento
dos sabe-tudo.
Que haja muita indulgência perante
sabedoria que encapota indigência e embófia. E que haja, por muito e muito
tempo, a humildade de tudo questionar e de as certezas duvidar.
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