3.9.14

Quantos segredos és capaz de guardar?

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- São precisos segredos – dizias, enquanto o queixo repousado sobre a mão parecia inspirar as ideias.
- São precisos segredos – perguntava eu – para quê?
- Talvez para deixar pelo ar o sedimento da cumplicidade. Talvez para não deixar que os laços fiquem lassos.
-  Mas...e se os segredos forem terríveis, pode alguém arrastar a quem os confia para o mesmo abismo que o atormenta?
- Julgas que os segredos são sempre matéria má. Pode haver segredos que se recomendem à saúde das almas...
- Desconfio que não. Até hoje, todos os segredos que me foram confiados trouxeram com eles fantasmas que dispensava.
- Ah! Mas tu tens liberdade para distinguir os segredos que queres guardar.
- Não! Uma vez revelado o segredo, tomara pudesse uma amnésia qualquer apoderar-se da memória. Não acontece. Ficamos reféns dos segredos.
- Já contaste um segredo de que te pediram para seres fiel curador?
- Sabes?, evito segredos. Segredos dos outros. Quando eles vêm com pré-aviso, declino a função. Não quero saber dos segredos dos outros.
- E não temes que ao não quereres ser guardador de segredos estás a trair a confiança de quem tos quer confiar? Não achas que é pior essa traição do que a traição de contar um segredo?
- Não quero saber. Há um limite. Por mais confiança que haja, quando quem revela um segredo sabe que está a impor uma violência ao outro, devia morder a boca, reprimir as palavras. Habituar-se a ter esse segredo como matéria apenas sua.
- Tu temes ser transgressor de segredos.
- Já te disse que não. Não quero saber dos sobressaltos alheios.
- Bem me parece que não te consegues desprender desse tremendo egoísmo.
- Chama-lhe o que quiseres. Não me interessa. Já me chegam as cicatrizes que trago na pele.
- E se um dia fores tu a querer confiar um segredo?
- Já aconteceu. Não foi agradável. E não foi por receio de que viesse a tornar-se público. As importunações pessoais devem ficar dentro das ameias do ser.
- Não devemos ajudar quem precisa?
- Não é disso que se trata. Um segredo deixa de o ser quando transcende o seu fautor. Dois, ou mais, a conhecê-lo e já não é segredo.
- ...
- Espero que esse silêncio não te traga a vontade de me contar um segredo.

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