10.11.14

A limonada dos profissionais do palpite

Einsturzende Neubauten, "Sabrina", in https://www.youtube.com/watch?v=CnnGYaqjW-A
Sabem tudo. E sabem de tudo. São a versão anónima dos que discorrem abundante opinião nas televisões e nos jornais. Sobre o assunto que estiver à mão de semear.
Os tempos não lhes correm de feição. À mistura com o palpite superficial coberto como uma putativa carga erudita, vomitam uma acidez que merecia tratamento; devem beber muita limonada feita com ácidos limões. À mistura com a fartura de adjetivos em orações que se entaramelam em sub-orações atiradas para dentro de longos parêntesis, cantam verdades insofismáveis. As que os seus olhos vêm, mais prescientes do que os olhos outros. Aliás, talvez em jeito de ocupação do tempo (ou talvez como generosidade de quem se oferece para o serviço público), informam e comentam a informação com verborreia aziaga, certezas infalíveis, imperativos categóricos, uma altivez risível e uma violência verbal que apetece interrogar se haveria coragem de passar à prática.
Às vezes, uma escorregadela no humor é pior emenda: são daquela têmpera que cospe o chiste e, antes dele terminar, só para avisar a audiência de que deve começar a esboçar a gargalhada, gargalham eles mesmos. Lamentavelmente (que a gente gosta de humor – mas de humor que honre a palavra), só eles riem do chiste medíocre. Por isso, logo a seguir mergulham na análise carregada de adjetivos, na implacável incineração de quem deploram, com juras de cadafalso atalhadas pelo caminho. Desfazem a nada quem se lhes oponha. E o pior não são aqueles que dizem o contrário apenas porque sim, pois a esses oferecem o desprezo da irrelevância. O pior acontece com aqueles que até sabem um bocado de uma das podas em que os profissionais do palpite arrotam opinião. Nada disso: eles são as mais altas sumidades; tanto que até sabem mais daquela poda do que os que dela são peritos.
As bestinhas funambulares não praticam o contraditório. E se houvesse dúvidas a transpirar da palavrosa prosa em que cavalgam o raciocínio obtuso, é só vê-los ensaboados na arrogância de quem se julga superior, mas acaba, nos braços dessa arrogância, por se entregar à confissão da sua pequenez. Deixá-los na pequena arte do palpite sobre tudo e mais alguma coisa: é preciso treinar a paciência. De caminho, rir também faz bem à alma.

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