Ryuichi Sakamoto, "Forbidden Colours" (solo piano), in https://www.youtube.com/watch?v=Y4tLtg-DMb8
O outono mete um punhal nos pactos. É
como se estivesse em constante faina contra a erosão dos elementos, retardando
as folhas caducas a que as árvores estão fadadas. Teimoso, devolve a riqueza
das cores sortílegas que vestem as árvores. Não é senescência; é pura beleza,
as cores ocres pintando quadros que enfeitiçam o olhar quando ele esbarra nas
extensas paisagens que são um manto acobreado. É outono. É o outono.
As cores ocre rimam com os dias plúmbeos.
Aquele tempo que entristece as pessoas vãs que só têm saudades da infernal
canícula estival e dos infindáveis soalheiros dias que são a combustão de uma
larga monotonia. Os dias taciturnos combinam com a folhagem que fica dourada
antes de se quebrar e as folhas sem préstimo encontrarem sepultura nas ruas que
são subúrbios das árvores. Mas antes do desnudo, elas ficam galantes, numa
madurez altiva a fazer lembrar que o envelhecimento não é uma fulgurante
decadência. Quando os dias outonais acolhem um lampejo de sol, o acobreado da
folhagem cintila como se estivesse a sorrir ao tempo que há de ser
transfigurado na aspereza invernosa. As folhas que vão sendo desgastadas à
medida que ganham tons dourados não se entristecem. Não pedem comiseração, como
se os olhos compungidos, talvez temerosos do demoníaco inverno que se anuncia,
chorassem lágrimas vetustas pelo verão que afinal disse adeus há tão pouco
tempo.
Enquanto a acalmia dos elementos despoja
o desassossego das tempestades furiosas, os olhos detêm-se, demoradamente, nas
árvores que se engalanaram com o traje outonal. Saciam-se no sortilégio das
cores que embaciam a fulgurância que vem com as folhas viçosas semeadas pela
primavera. Cores que são um mantimento para a alma. Uma tela onde se compõem
poemas com estrofes que vão à seiva que ainda circula nos vasos sanguíneos das
folhas enrugadas. Não, não há vertigem quando os elementos depõem a madurez das
formas e das cores. Nem resignação quando se congraça o andamento dos tempos
com as formas que se moldam em correspondência.
Tudo tem um tempo que é seu. Madraços são
os que, embebidos de uma nostalgia datada, recusam reconhecer o tempo que é.
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