Nils Frahm, “Says”, in https://www.youtube.com/watch?v=dIwwjy4slI8
Oxalá o tempo não fosse adstringente, uma maçada que irrompe contra a vontade consagrada. Oxalá o tempo não fosse uma escassez que se devolve em forma de contratempo. Dizemos, em puro desperdício de forças, que somos matéria volúvel à mercê das veleidades do tempo despótico, e não percebemos que pensamentos destes apenas conseguem tornar o tempo um lugar ainda mais exíguo. Não devemos ser nós a fazer do tempo um santuário de ambiguidade.
Impõe-se novo critério. Os relógios deixarão de ser uma espada a adejar constantemente sobre o pulso tomado pelo terrível medo do tardio. A medida será outra: nunca é tarde para nada, nem nunca é tempo sequer para sermos sitiados pelo apressar (que deixa de ser um imperativo). Deixaremos de correr contra o tempo. É uma empreitada frívola. À partida, condenada ao malogro. O tempo não é uma vulgar quimera a quem se pode torcer o braço. Não tem serventia correr contra o tempo, pois nem toda a força imaginável o consegue deter. A ilusão que se desembainhe – a de curvar o tempo à soberania da nossa vontade – assegura a extemporânea demissão do ser.
Passaremos a correr a favor do tempo. Teremos o tempo como aliado. Sem a permanente conceção da sua efemeridade. Sem sermos tomados pela totalitária opressão que interroga a brevidade do tempo. Passaremos a ser o braço que ajuda a mover o tempo. No milagroso recobro onde se resguarda a serenidade da alma, protegida contra as adversidades que são a adulteração de tudo quando se legitima a ideia que somos fautores de um tempo diferente do tempo. Talvez se corrermos a favor do tempo conseguimos o sortilégio de o ter do nosso lado. A noção de correr contra o tempo é uma empáfia, que se contrapõe ao eterno relógio de onde somos apenas um ingrediente sem visibilidade. Essa será a nossa grandeza: temos as camadas do tempo nas nossas mãos, sabemos de que tecido são compostas, e só nós é que instruímos o tempo assim concebido.
Se soubermos correr a favor do tempo, não somos consumidos pela vertigem de que somos perceptores ao darmos conta da sua fluidez. Nos diferentes mecanismos do pensamento, descobrimos os lugares onde se caucionam os estamentos paralelos do tempo – o tempo em sua pluralidade. Ao corrermos a favor do tempo, descobrimos, finalmente, que o tempo é uma palavra plural. E, enfim, envelhecer deixará de ser uma opressão.
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