18.1.19

Ou tudo ou tudo


Interpol, “Pioneer to the Falls” (Live for BBC Radio 6 Music), in https://www.youtube.com/watch?v=oeqhWLKJB9I
Subida a parada, o mastro não chegava para hastear a ousadia desfraldada. Não podia haver lugar aos contratempos nas equações que se sobrepunham no papel exposto. O franco desembaraçar dos impedimentos só podia desaguar num opúsculo vibrante, recreativo, fecundo, uma obra-prima. As duas hipóteses reconduziam-se a uma só: tudo estava preparado para sair a ganhar. Não havia meio-termo. Nem o cenário oposto. Porque não é de apocalipses que consta a ementa gravada a talha dourada. 
Dizia-se que os sonhos são um ardil de que só se dá conta quando pertencem à fornalha onde se incineram as desesperanças. Desta vez, não. Desta vez, tudo haveria de dar certo, o desenlace como desejado. Não seriam advérbios de modo orquestrados em salões conspirativos dando a volta ao mundo só para travar o passo ao desejo. Não seriam vultos medrando em sua hipocrisia travando o desiderato. O convencimento era a ignição do resto. Abraçado à perseverança do ser, um autêntico estado de alma, inderrotável.
Nas narrações vindouras, ficaria o selo intemporal do conseguido. Mas era cedo para começar a escrever história no futuro. Sempre alguém, de supersticiosa cepa, podia advertir que o azar pode espreitar, o malfadado, com seu impaciente bafo de contradição. Não era preciso dar crédito à advertência: estava tão seguro, que tais imponderáveis não subtraíam o sono. A visitação consecutiva de frases marcantes que desfilavam na paisagem mental ajudava a consolidar o convencimento do esperado. 
A meio do caminho, foi assaltado por uma hesitação. Apesar de nunca ter pressentida tão certa uma aspiração, interrogou-se se chegava a tinta farta do convencimento do esperado. Outra coisa podia ser o lado oposto do labirinto em que se metera. O que se espera hoje nem sempre é selado no cúmulo do tempo determinado como mapa que transige com o resultado desejado. Nesse caso, já não podia formular, com a determinação de quem é couraça, que é tudo ou tudo.
Foi a tempo de resgatar a postura ambiciosa. Era mesmo tudo ou tudo, sem lugar a alternativas. Teve medo. Nunca soubera a que sabia este grau de certeza à prova de contingências. Tinha a noção das variáveis que fogem ao seu domínio, de como as contingências, inesperadas como são, podem gorar um resultado esperado. Não esquecia como sempre rematara as demandas com uma sucessão de interrogações que obstavam respostas terminantes. Mas não desta vez. Não era o palco das tergiversações, das perguntas metódicas, que estava em causa. Era tudo ou tudo.   

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