Nils Frahm, “A Place”, in https://www.youtube.com/watch?v=emo-ch_nEBc
Em aparente contrafação, o dia ímpar. Não o dia singular, que esses têm caução de serem industriados pelo desassombro, pelo insólito, selados no calendário dos tempos com uma marca indelével. O dia ímpar, por fugir ao testamento tornado matéria viva. Mas o dia ímpar, que também há lugares no calendário que são destino do dia ímpar. Algures entre o impermeável pensamento, um sobressalto inesperado (e não são todos inesperados, os sobressaltos?). Uma química substância apodera-se das veias, destronando o viés do sangue fervente. A inércia contamina-se. Não se afigura o paradeiro do sobressalto, que provoca uma combustão ao contrário: o fogo extingue-se no diadema do dia ímpar. Mercê da improvável inércia, desenvolve-se uma espiral sem freio: a cada hora que passa do dia ímpar, parece que o dia se torna cada vez mais ímpar, o sinónimo de insuportável. E que se chegue à frente a primeira pessoa que diga de si mesma que nunca se sentiu insuportável! Este é o condão do dia ímpar. É, nessa medida, reconfortante. Por ser ímpar, uma exceção que se enxerta no vasto território onde campeiam os dias pares. Esses é que são a singularidade apreciada. O dia ímpar não se interpola, com precisão matemática, com os dias pares. Estes é que têm o presságio da pluralidade; o dia ímpar é singular, mas apenas como antónimo de plural. Por isso é que o dia ímpar acaba por ser uma reconfortante paisagem, habilitando-o como medida suportável do estado insuportável que subiu à tona. Não interessa se não deixar as horas fazerem seu percurso no dia que as habilitou. O sono será a esperança que levita o suplício do dia ímpar, sepultado no refúgio de sonhos não malsãos. É esta a utilidade do dia ímpar: se todos fossem dias pares, sem haver a degustação do aziúme a que vem acorrentado o dia ímpar, o deleite dos dias pares dissolvia-se na letargia rotineira.
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